terça-feira, 17 de março de 2015

CORAÇÃO BLINDADO

     Assisti hoje o filme Para Sempre Alice e, confesso, não me arrependi. Digo isto porque o tema é tremendamente desconcertante e quando vou ao cinema é para me distrair. Focar numa terrível doença como o mal de Alzeimer e discorrê-la durante toda a filmagem, não seria uma chamada para mim.
     Porém, enchi-me de coragem. Até porque, ultimamente percebo que meu coração anda meio blindado para certas cargas de emoção.
     A narrativa acontece de modo leve e delicado. Os diálogos nos prendem a atenção. Os atores são excelentes e tudo é conduzido de uma forma tão inteligente que nos concentramos do começo ao fim, com certos momentos de suave e pura emoção.
     Já no retorno para casa, na condução, refletindo ainda no desenrolar da estória, me detive a analisar certos esquecimentos que cometemos na vida. E me surpreendi.
     Passei dos esquecimentos rotineiros de pequenas coisas e de fatos mais relevantes para os dos sentimentos. Pessoas aparentemente saudáveis  fisicamente, mas que desconcertam aqueles que nada de mal fizeram. Ao contrário, prestaram favores, contribuíram com alegria esboçada em sorrisos e atenções, ofertaram o seu tempo. Mas eles disto se esqueceram. Gritam seu desespero, olham com seu próprio desprezo, gesticulam com a sua própria alienação.
     Esquecem-se também da fala mansa,  da cortesia, da gentileza, da educação que, certamente, receberam. Esquecem-se do que pregam e agem então por impulsos brutais. Esquecem-se das cenas belas, das pessoas boas e das crianças puras  com as quais conviveram  e se deixam abater por maus pensamentos, pela raiva e pela hostilidade. São dominados pelo esquecimento dos atos bons momentaneamente.
     Pessoas assim  me causam estranheza. Fico triste em perceber o descaso com que tratam aqueles que procuram ajudar, colaborar, participar de suas vidas. Não lembram mais como é bom tratar as pessoas com amabilidade e doçura! São impacientes, irritadiços, intolerantes.
     Mas esta atitude agressiva , na vida atual, é  comum. Muita tecnologia, contudo o coração tornou-se um tanto necrosado. Seria um mal de Alzeimer na alma, no sentimento.
Para estes talvez a cura surja quando a consciência despertar. É viver pra ver e ver pra crer.
 

"...
Eu me lembro daqui, outrora,
aproveitando o tempo fresco.
Com frequência andava
na beira do lago
bordado de árvores.
..."
(Du Fu)