O idioma italiano sempre me atraiu, seja nas canções, seja nos filmes. O cinema, o canto, seus artistas sempre me comoveram.
Entrei, há um tempo atrás, numa lojinha de CDs e encontrei Toquinho cantando em italiano! Uma raridade. Em seus arranjos de violão, a gente sonha... Composições de Toquinho, de Vinicius, de Paulinho da Viola, Baden Powell, dentre outros. Samba em Prelúdio, Se ele quisesse, Escravo da Alegria e por aí vai um desfile de bom gosto. Um popular requintado!...
Quem não lembra de Dio come ti amo, Che Sarà, Per Amore, Amore Scusami, Parlami D'Amore, Mariù!... O grande Andrea Bocelli me emociona com sua voz terna e, ao mesmo tempo, vigorosa. Aliás, os italianos têm essa característica: somos cativantes pela amorosidade e intensos na expressão. E aí eu me incluo, já que descendo de uma família italiana, pelo lado paterno.
Meu avô Pedro era italiano e veio para o Brasil ainda criança. Levantava-se bem cedinho e ia cortar lenha para alimentar o fogão. Logo, logo pela chaminé, os rolos de fumaça subindo aos céus... Tempos de menina!... Férias com meus avós!... A chácara, as árvores frutíferas, o pequeno canteiro onde vovó Ritinha, descendente de índios, plantava ervas medicinais. E me ensinava: "_ Minha netinha, eu mastigo a folha, ao invés de preparar chá..."
O rio Paraíba do Sul, próximo, era refúgio meu e de papai para pescarmos! Vínhamos com a caçamba cheia de lambaris e entregávamos para mamãe ter trabalho. Pulávamos as pedras de variados tamanhos, no meio do rio, até acharmos uma maior, na qual ficávamos, quietinhos, à espera do peixe... Papai me ensinava o silêncio. Como era bom ter meu pai tão próximo, tão amigo.
A casa era grande, de fazenda. Víamos o telhado e, à noite, os morcegos. Naquela época, tudo nos divertia. O lustre era um fio pedurado e, na extremidade, a lâmpada com o interruptor. Bem mais prático do que nos tempos atuais.
O quarto onde eu ficava era lindo, tinha uma penteadeira grande com tampo de mármore cor-de-rosa e um espelho enorme cuja moldura era toda trabalhada. Uma obra de arte!
Na sala, os móveis todos tinham espelhos nas portas, do lado de fora.
Janelões grandes, a madeira verde emoldurava os vidros. A casa pintada de branco e, à frente e nos lados, os jardins, a horta, o pomar. A limeira irreverente se infiltrando no quarto de papai e mamãe, pela grande janela.
No outro quarto, uma galinha acostumara-se a colocar ovos na cama. E vovó, pressurosa, preparava-os quentes no café da manhã. Um pequeno arbusto de folhas delicadas, ficava logo abaixo da janela deste quarto e eu achava tão romântico! Era o quarto de meus avós. Como se amavam! Muitas vezes tomavam banho juntos. Mamãe meneava a cabeça, num pequeno gesto de condenação, talvez porque achasse meio indecente já que eu era uma criança. Bobagem!... Eu achava lindo! Dois velhinhos apaixonados ainda, carinhosos que se banhavam juntinhos. Era demais. Eu via amor, naturalidade, simplicidade e beleza no gesto.
Tantas lembranças... Hoje, simples gestos de amor, o silêncio nas pescarias, um riacho, limas-da-pérsia, goiabas suculentas, mangas-espada, passarinhos, arbustos delicados, doces carambolas, tudo isso me lembra de Sapucaia.
O jeito italiano do meu avô que vivia cantarolando, feliz, que amava sem medidas , que sorvia o vinho tinto italiano à hora do almoço, que gostava da chácara e de lidar com a terra, que acordava cedinho para a lida e também cedinho se recolhia, que estava sempre sorridente, de bem com a vida; também tinha seus momentos de reflexão e recolhimento _ era o jeito italiano de ser. Um jeito amigo, verdadeiro, alegre, amoroso, expansivo!
No baú do coração guardo as lembranças mais belas dos tempos de menina ao lado dos meus avós e das canções italianas sempre a falarem de amor, de paixão! Gente de sentimentos exacerbados, povo alegre, festivo, cantante...! Uma viagem no tempo que aguça o meu ideal romântico e faz retornar os sonhos da mocidade.