domingo, 29 de janeiro de 2017

O QUE NOS DÁ SUPORTE

     Tudo parecia estar dando errado naquele dia. Na acupuntura, senti muita dor, pois um " tendão tinha sido atingido", explicou-me o acupunturista, além do calor infernal  na saleta, que fez com que minha pressão caísse e me sentisse mal. O aparelho de ar condicionado precisava de reparos.  Coisas que podem acontecer...
    Logo cedo, quando saía do prédio onde moro, estranhei toda a aglomeração formada no portão de entrada. O motivo? Um larápio esperto, assim que viu a senhorinha com o celular em punho, meteu a sua mão acostumada a estes feitos pela grade de ferro e arrancou-lhe o aparelho! Saiu em disparada pela bicicleta que deve ter sido surrupiada, por certo.
     Aquilo abalou a todos nós, moradores, além da vítima que, trêmula, mordiscava os lábios rugosos, visivelmente abatida. Afinal, ninguém imagina que, estando do lado de dentro do portão  ainda trancado, possa sofrer um assalto.    
     Cheguei no restaurante para almoçar já fora da hora costumeira. Uma leve tonteira persistia e me inquietava. Havia fila e tive que sustentar a bandeja com a minha refeição, tive que esperar os caixas se entenderem, tive que aguardar uma mesa... Enfim, consegui me sentar e devorar o frango saboroso com batatas doces ao forno com alecrim. Xô, azar!...
     Depois da  ida ao toilette  dar uma retocada no batom, resolvi algumas coisas no shopping e tomei um cafezinho que vem acompanhado de uma bolinha de ... sorvete! Já tinha experimentado em Salvador, mas agora há um quiosque também  aqui no Rio, no  Shopping Rio Sul.    
     Refeita, resolvi voltar para casa e me dirigi ao ponto dos táxis. A jovem funcionária olhou para mim, meneou a cabeça a confirmar , abriu gentilmente a porta do carro alto. E, assim que entrei... tive uma surpresa!
     O painel estava completamente tomado por pequenos carrinhos amarelos, um ou outro destoavam pelo tamanho ou pela proposta. Havia, no meio deles, uma bonequinha dançarina que, assim que o sol a tocava, ela , graciosamente, dançava. E tudo ali tinha alegria, ritmo de festa.
     Pouco a pouco, a história da aquisição de cada carrinho me surpreendia e me encantava. Um foi a esposa , outro o neto, mais aquele, a neta e , cada um, com o seu enredo peculiar.
     Entusiasmei-me tanto que esqueci de lhe dizer o endereço. Só tinha dito o bairro. Quando aqui chegou, parou o veículo, olhou para trás e, docemente, perguntou-me "_Qual a rua, senhora?"
     Rimos muito e ele mesmo justificou o meu esquecimento... Disse-me, alegre: "_ A senhora ficou tão admirada e perplexa que se esqueceu de me dizer para onde queria ir..." Concordei. Coisas assim não são comuns.
     Foi um banho de restauração da fé no ser humano. Aquele homem simples cativou-me pelo que disse sobre a família. Animei-me tanto que chegou a me mostrar fotos que guarda consigo da mulher , dos filhos e dos netos. Seu grande tesouro.
     É o que faz a diferença na vida. Não são as conquistas materiais que nos dão suporte , mas sim  o abrigo nos corações de quem amamos.
 

sexta-feira, 13 de janeiro de 2017

RAPSÓDIA HÚNGARA!...

O motorista do táxi foi gentil. Cuidou da minha bagagem atentamente, verificou as portas  do veículo, mais de uma vez, para garantir a segurança, ofereceu-me caramelos, todos envoltos em papel dourado.
     Pecou na música. Não que eu não aprecie samba, o ritmo da minha terra, mas aquela batida repetida sistematicamente, durante uns cinquenta minutos ininterruptos, sempre com o grito: " Ôôôôôh, Bahia!" __talvez uma alusão ao famoso time de futebol,  causaram-me um certo estranhamento.
     A saudade  dos familiares que já se antecipava no coração, mesclada à boa emoção de rever toda aquela paisagem lindíssima reportava-me, sim,  a uma Rapsódia Húngara!...
     Aproximadamente às seis da manhã  iniciei a jornada da minha volta ao Rio de Janeiro.  No percurso, pela orla, pude ver e apreciar, causando-me espanto e admiração , dezenas de pessoas já caminhando  , tão cedo! Justifica-se: o sol em Salvador é muito mais vigoroso do que em outras capitais.
     Senhoras e senhores usavam suas bermudas e algumas poucas jovens suas calças longas fitness. Todos de tênis, naquela evolução otimista e saudável, ante o mar e o céu pujantes!
Em vários tons de azuis, verdes, roxos, cinzas e brancos ele, o céu, deslizava, ante os meus olhos, todo o seu mistério. Durante muito tempo, o percurso foi assim.

 
     Em Piatã, barracas brancas cuidadosamente fechadas formavam um quadro pitoresco, ornando as areias claras ante um mar vistoso.
     Ciclistas alegres com suas vestimentas e capacetes adequados ao esporte ,em Costa Azul, se encontravam para começarem o passeio habitual.
     Tudo o que vi  durante o trajeto serenou e alegrou o meu espírito. Salvador__ uma cidade conectada com a modernidade e a vida saudável.
     No entanto, quando chegamos próximo ao aeroporto, no caminho ladeado por bambuzais, quase  prendo  a respiração. Observo, sem piscar. E deixo-me arrebatar  pela poética visão.



segunda-feira, 9 de janeiro de 2017

TURISTA TAGARELA

 
     O mar estava um pouco mexido, mas as gaivotas enormes, lá pelas dez, mesmo assim  compareceram. Fartei-me destas águas e das  paisagens da praia da capital do mundo, Ipanema.
     Cheguei cedo, como de costume, senão a pele delicada não aguenta sob o sol escaldante e a barraca, por dez reais o aluguel, acho caro pra tão pouco tempo.
     Acomodava-me, o melhor que podia, na canga estirada na areia e relaxava, a cada retorno de um mergulho.
     Findo o prazo por mim mesma estabelecido, arrumo a mochila com o que tinha levado e volto, caminhando pela areia já quente, pés encaixados nas havaianas verdes , que ganhei de presente.
      Decido bebericar um coco geladinho, coisa rara, pois aprecio as bebidas na temperatura ambiente. Mas se resolvesse hoje desta maneira, por certo viria fervendo.
     Acomodei-me na  única cadeira à sombra do quiosque habitual e sorvi lentamente aquela água deliciosa. Ao lado, uma jovem incomodou-se um pouco com a minha decisão de sentar-me tão perto, apesar de estar em outra mesa...
     Não entendi muito bem , mas ali permaneci. Afinal, a presença do sol forte e impiedoso dominava o ambiente.
     Comecei a reparar ao redor. Nossa! Os barraqueiros, jovens das comunidades perto dali, assanhavam-se. Um mais ousado caminhou até nós e, passando pela moça, murmurou, caprichando no olhar: "_ Mas o que é isso, papai do céu!?" Com a entonação adequada a uma paquera!
     A bonita jovem não era daqui. Percebi logo. Mesmo com roupas comuns, próprias de praia, seus longos cabelos lisos e louríssimos chamavam a atenção. E eram de verdade! Notava-se a naturalidade da cor e dos fios lisos a correrem soltos, na brisa leve que vinha do oceano em nossa direção.
     Ela se mexia muito. Inquieta, virava o seu corpo pra cá, pra lá, percorrendo com os olhos, um tanto aflitos ,os caminhos. De repente, surge um rapaz muito simpático e ela, então,  se mostra aliviada.  Ri alto, feliz. Conversam, em inglês, animadamente. Até que ela passa a liderar e monopolizar . Chega mais um conhecido.
     Aguço a audição. Combinam viagens e citam Salvador, várias vezes. Tenta ser simpática e pede, em bom Português, um coco. Agradece também na nossa Língua.
     Observei o rapaz que sempre me atende educadamente, quando vou ali. Mas hoje, sua voz saiu mais límpida e forte, sua postura era exemplar, ombros pra trás, mostrando seu porte atlético. E grau dez em cortesia, com louvor! Atendeu à moça com exímia habilidade ao trazer o coco ,a tampinha dele e o canudo ainda no plástico.
     Estava animada a conversa... oh, não , não mais uma conversa! Agora, somente ela  falava, entusiasticamente, muito alto e pelos cotovelos, aos borbotões!... E os rapazes, pasmos, raramente conseguiam exclamar pequenas interjeições ao longo daquele metralhar de palavras.
    
    
    
    
    
    

sexta-feira, 6 de janeiro de 2017

EVELIN, DA BRASIL CACAU

"...
Olhar, reparar tudo em volta, sem a menor intenção de poesia.
...
Lembrar de lugares que a gente já andou e de coisas que a gente já viu.
...
Sentir o sol. Gostar de ver as coisas todas.
...    
Descobrir que, afinal de contas, não se possui nenhuma queixa.
...
Como é bom ter vindo de tão longe, estar agora caminhando
Pensando e respirando no meio de pessoas desconhecidas
Como é bom achar o mundo esquisito por isso, muito esquisito mesmo
E depois sorrir levemente para ele com os seus mistérios...
 
(Manoel de Barros)
 
 
     Hoje foi um dia de algumas providências. Coisas pequenas, do dia  a dia. Saí cedinho, antes que o sol queimasse a pele, mesmo com o uso de  protetor solar fator 30 , chapéu de palha que encontrei por cinco reais numa charmosa lojinha da Praia do Forte, óculos grandes e escuros, roupas leves e confortáveis!
     Usei uma bermuda branca, abaixo dos joelhos, de tactel e uma blusa sem mangas, antiga, descoberta numa liquidação da Dimpus. No dia, quando cheguei em casa, reparei que tinha um fio puxado... Ora essa! E quem vai notar  neste detalhe?
      Lá fui eu, depois de usar a nova colônia da Granado, Folhas de Laranjeira. Apesar de conter pimenta na sua fórmula, ela refresca... Dica da Consuelo, a Pascolato, com a qual me identifico nos gostos e atitudes.
     Caminhada habitual, água de coco pra refrescar e resolvo voltar pela Visconde de Pirajá. Abordada ainda no sinal  da esquina da Vinicius de Moraes pelo pedinte trôpego , que simulou uma tonteira para cair em mim. O plano mal sucedido fez com que ele mostrasse sua agressividade. Eis que sou perseguida pelo indivíduo, por algumas quadras, ouvindo palavreado  pretensamente ofensivo. 
     Sinto piedade, mas há muito tempo meus pés não se moviam  tão rápido!  Dou graças a Deus por não estar usando bolsa, seria mais um motivo a gerar estresse...Documentos   e dinheiro distribuídos nos bolsos da calça esportiva.
     O homem, pelo caminho, foi ficando pra trás, até que desistiu do seu propósito mal-intencionado.
    Com a forçada maratona já suava! Entrei na banca de jornais em busca do 'guia da semana' e me compadeci do jovem que atendia. Talvez por isso estava tão mal-encarado... o calor, ali dentro, era quase insuportável.
     Saí dali e, perto, na mesma calçada,  entrei na loja simpática que vende gostosuras.  Um ar condicionado suave refrescou-me. Nela, garanti a tapioca para alguns dias.
     Determinada, continuei a jornada. Ainda bem que calçava tênis! Os pés agradecem. Cheguei até a loja de chocolates. No verão? Pois é. Mas a minha amiga adora. Comprei aqueles que têm um creme dentro de uma casquinha delicada. Nhá-Benta, eu acho. Recomendei-lhe que colocasse na geladeira, pois ficaria, aí sim, uma delícia! Mimo de Natal, porque tinha viajado e sei que ela sempre espera alguma lembrancinha.
     Nesta loja, entreguei o produto ao rapaz do caixa e perguntei-lhe se havia alguma sacolinha para presente. Ele, afoito, logo me disse que não. No entanto, uma das colegas, que estava abaixada, arrumando umas caixas, atrás do balcão, olhou, levantou-se e disse:
     _ Como não? Tem, sim!
      Ele insistiu, meio sem graça...
      Ela novamente retrucou e apanhou, ali mesmo, , num pequeno compartimento , um saco dourado. Mostrando ao colega , ainda disse: _ Viu? Eu não falei?
     Não preciso narrar o jeitão do moço que foi ficando murcho... cabisbaixo. Ela pegou  a caixinha de merengues com chocolate, colocou no saco e...
     _ Viu? É grande demais! Vai ficar feio!...  disse ele.
     Calada, com mãos ágeis, à nossa frente, fez um dos embrulhos de presente mais bonitos que já vi!
     Impressionei-me com a sua atenção, a sua destreza e inteligência, gentileza, rapidez e bom gosto!
     Falei-lhe que observei sua extrema habilidade  e  boa vontade no atendimento, que , atualmente, costuma ser precário no comércio.
     Digna de nota, a atitude decidida da moça.

     
    
    
    

quarta-feira, 4 de janeiro de 2017

SEM PEDIGREE

     Acordei cedinho e logo decidi. Peguei a nova canga colorida, a mochila cor de areia, vesti o biquíni (na realidade, do biquíni, gosto de usar somente  a parte de baixo e sempre estampado, pois  esteticamente diminui as proporções do quadril abrasileirado... e um top de cor única), joguei por cima a saída uv-line, calcei as sandálias esportivas (muito melhor pra caminhar, do que ficar arrastando  havaianas) e meus óculos escuros pra arrematar o figurino!
     O ar ainda fresco, o sol prometendo calor. O mar estava para peixes! E pras sereias, claro. As balzacas, pois as jovenzinhas ainda sonham em suas camas macias.
     Fui logo pro mar! Que movimento intenso era aquele das gaivotas e das fragatas? Pra lá e pra cá, iam e vinham, agitadas, com fome! Voando baixo, chegavam até  o final do Leblon e quase desapareciam nos ares; então, retornavam, fazendo círculos em nossas cabeças. Que momentos  mágicos! Mergulhavam, certeiras, nas águas que refletiam os azuis puríssimos e, assim como o poeta, " o azul me descortina para o dia." Ao longe, outros tons, verdes e lilases, invadiam o   horizonte silencioso.
     Vi, assim que entrei nas águas suaves,  cardumes de peixes pequeninos e coloridos  de verde metálico. Lembrei-me de Manoel de Barros: " Escuto a cor dos peixes".
      Foi demais! A natureza sempre me surpreende e me encanta. Fiquei ali, por minutos, parada, estática,  completamente hipnotizada pelo delicado movimento das águas, seus murmúrios  quais mantras e pelos cardumes que seguiam a cadência das ondas, como dançarinos. Iam de encontro uns aos outros, sem perderem o ritmo, absolutamente no compasso.
     Trouxe comigo estas imagens e sensações de vida.  À nossa frente, os mergulhos irreparáveis das grande aves do mar a todos embeveciam. Voltei para a areia e relaxei sobre o pano estendido.
     Porém, em  instantes, percebi uma voz destacada. Prestei atenção. Levantei o boné do rosto e vi um homem que trouxe o seu cão para se banhar..." Será que desconhece as regras? Será que não sabe da Praia do Diabo, ali pertinho, logo depois do Arpoador, onde a presença de cães é permitida? " pensei.
     Passei a reparar na cena nova, cujo cenário, ainda deslumbrante, tremeluzia ao nosso olhar sensível. O rapaz chegou perto de um banhista que estava sentado, a apreciar toda aquela belezura, sossegado, mas que  teve que ouvi-lo. Ele falava alto, gesticulava muito. Discorreu o tempo todo sobre o cachorro! O outro,  calado, só meneava a cabeça, concordando. Uma ou outra vez, pronunciava pequenas exclamações: "_Ah!", " É?" " Sei!"...
    Contou que seu cão era um pastor-alemão, encontrado depois de muita procura num dos melhores canis de são Paulo, que é extremamente raro pois é negro, que o veterinário é um dos melhores  e fica em Petrópolis, que só come ração indicada, que é muito desenvolvido e inteligente para a idade dele, pois só tem três meses e cinco dias! E novamente pensei:" Que mimo de rapaz, quanto amor ao animal..."
     Com sua bermuda branca extra larga  de tactel o cara continuava sem parar, porque quando parava de conversar com o outro homem, ele falava com o cão, tentando fazer com que se exercitasse nas águas do mar, o que justificava dizendo que era bom para a desenvoltura dos músculos.
     O homem, cá pra nós, era esquisito. Mas resolvi desistir de qualquer julgamento antecipado. Observamos somente, eu e Célia,  com quem depois conversei. Mais atenta,  ela revelou-me , assim que foram embora _o homem, com um longo cigarro  no canto esquerdo da boca e o cachorro cheio de areia pelos rolamentos insistentes que fizera_  que ele pegou o coco na grande lixeira próxima da COMLURB( havia lixeiras por toda a praia )  para o cão brincar; mas na hora de ir embora, deixou a casca da fruta no chão, sem nenhuma preocupação.
     Logo vi!  Aquele estardalhaço todo disfarçava, na realidade, o deseducado cidadão, sem nenhum pedigree...
Rações importadas, vitaminas , veterinários de renome, classificação de raça... o pobre cão queria mesmo  saltitar, andar à toa como os passarinhos, sentar e admirar as fragatas, correr, livre, a perseguir pombos,  queria mesmo era mil vezes  rolar  na areia grossa da praia...
 
 

domingo, 1 de janeiro de 2017

NO TEMPO DA CARROCINHA JÁ HAVIA BIGODINHOS

   


 
    Fui à praia. Afinal, no primeiro dia do ano, é quase obrigatório o passeio.
     Busquei uma rua sombreada, pois o sol tinia mesmo ainda tão cedo. Fui caminhando devagar, observando as árvores, ouvindo seus cantos, absorvendo o ar sereno. O céu azul me inspirava doces pensamentos e paz no coração.
     Uns quinze minutos de caminhada e lá estava eu, em frente àquele mar que deslizava suas águas, atropelando surfistas amadores e banhistas incautos.
     Era muita gente. Resolvi sentar na cadeira que vagou de repente, num dos quiosques da orla. Pedi um coco geladinho que custou-me seis reais! Acho caro. Em Salvador sai a dois e é mais docinho.
     Passou um filme na minha mente, quando, há alguns anos, fui ao Arpoador, à tardinha, com a família para passear. Morávamos em Botafogo e fomos de carro. Não havia quiosques. Simplesmente uma carrocinha da Kibon. Pedimos alguns picolés e saboreamos apreciando a paisagem. 
     Como eu nunca tinha ido àquele lugar?!... Era deslumbrante. E apaixonei-me. Assim. De supetão.    
     Hoje, no primeiro dia do ano de 2017_ e espero que seja muito bom para todos nós_ vi a praia do Arpoador muito cheia! Pessoas diversas, cães,  moradores de rua... tudo misturado.
     Uns poucos correndo ou fazendo a caminhada de rotina; um ou outro corpo bonito, viçoso, vistoso; a maioria, disformes, feios, maltratados... Senhores tentando o equilíbrio em bicicletas no meio da multidão; senhorinhas sapecas tentando fazer pose com... cigarro?...
     Moças  exibiam suas bundas moles com orgulho, num farrapo chamado fio dental sem nenhum pudor; um rapaz, no seu pequeno mundo ilusório, a rebolar  com um gingado de fazer inveja a muitas mulheres, desfilava seu corpo na sunga comportada e colorida , cabelos bem cortados num tom loiro metálico. 
     Um casal e um senhor idoso aproximaram-se, pediram licença, colocaram dois cocos na mesa, cortaram e em cumbucas ofereceram aos seus quatro cachorros. Ao passarem a água dos cocos para os pequenos vasilhames, molharam a mesa, as cadeiras e o chão. Foram embora, deixando o rastro da deseducação.
     E quem quer ser educado? Quem quer respeitar o outro? Respeitar? O que é isso mesmo? Educação. Conhecimento. Convivência boa, amigável, confortável para todos. Ah! Sonho.
     Uma meia hora e já deu. Resolvo voltar. Nisso, chegam dois ônibus da Guarda. "Que maravilha!" , pensei. Saltaram somente dois... Dois jovens gordos, pançudos, cansados, já ofegantes, carregando cassetetes. Completamente despreparados, a meu ver. 
     Dirigiram-se ao Parque Garota de Ipanema para buscarem uma sombra!... E lá ficaram debaixo de uma frondosa árvore, conversando, trocando ideias, sem prestarem atenção ao movimento intenso ao redor. 
     Passei por eles preocupada. Mas, com os ouvidos treinados, percebi um som insistente. Um mavioso som. Claro, não era produzido pelo homem... não, não! Um passarinho, um pequeno pássaro, pousado num dos galhos da copada árvore trinava insistentemente. Olhei bem. Parecia , a princípio, que se tratava de um coleirinho, mas não era. Não apresentava aquele colar branco e preto. Este tinha a cabeça negra com três faixas brancas. Acho que encontrei um bigodinho.  
 
FELIZ ANO NOVO!