domingo, 29 de abril de 2012

TERAPIA JÁ !

    " Não pode!"
  "Não deve!"
  "Isso é feio!"
"Psiu! O adulto está falando!"
Isto é pecado!


     Era tanta opressão que nos acostumávamos; principalmente nós, meninas, doces, atentas e submissas ao que nossos pais determinavam.
     Ainda bem que, com a tal da maturidade, algo aconteceu em nossas consciências. Abriu-se um clarão. Ao longo do tempo, percebíamos que tínhamos ideias proprias, desejos nossos, o coração tinha voz, não era mudo. 
     E, assim, aos poucos, fomos realizando o que realmente importava para nós. 
     Mas, voltando no tempo, recordo-me que na sexta-feira santa não podia falar alto, assobiar(papai sofria, pois vivia assobiando), ou mesmo cantarolar, que era quando minha alma se libertava! Granada era o que mais gostava. Pulmões jovens, força na voz, vontade de me soltar. E quando soube que nossa vizinha curtia meus momentos de estrela, chegando a dizer-me que aquele era o momento mais alegre do seu dia, aí mesmo foi que passei a caprichar. Aliás, pensando melhor, fiquei mais atenta à letra da canção, porque sabia que alguém me ouvia e apreciava. Perdi um tanto da naturalidade. Afinal, não queria  decepcionar ninguém!
     Quando o Semeando Poesia se reuniu nos jardins do Palácio do Catete, em abril passado, na primeira sexta-feira, surpreendi-me. A primeira sexta do mes era sexta-feira santa! Portanto, pensei, talvez ninguém comparecesse. Mas, eu iria. Ah, sim, senhor! Iria dizer poesia no jardim, semear alegria boa, dessa que faz bem ao coração.
     Cheguei mais cedo, como costume, e lá encontrei um casal e um parente deles já à minha espera. Bem, pelo menos mais gente iria compartilhar comigo desta euforia. E foram chegando... as amigas... os curiosos... as pessoas que me avisaram que não iriam , porque teriam compromisso na Igreja...
     Lá estavam todos eles animados, com seus livros, com os poemas seus e de outros autores. Foi uma festa! Ainda tentei dar um tom místico, dizendo Falai de Deus, de Cecília e duas de minha autoria de cunho espiritualista: Deus (originalmente escrita em inglês como You are God! e premiada nos Estados Unidos) e Porquês (consta na Antologia dos Poetas Brasileiros, de 2010).
     Após cerca de duas horas de poesia, uma delas pede para dizer uma piada . Não pude negar. Afinal, são 83 anos de vida, deixou o canto lírico por motivo de saúde e dedica-se agora à literatura, principalmente à feitura de poemas. Não pude negar. Falou e fez todos ali presentes sorrirem. E o que mais precisamos nesses dias? De sorrisos! 
     Como crianças, que descobrem um brinquedo novo e atraente, quase todos também lembraram de alguma piadinha inocente e compartilharam conosco. Foi mágico! Vi rostos que chegaram meio acabrunhados saírem dali sorridentes, felizes.
     O caminho da Arte não tem volta. Preenche tanto os nossos corações, alimenta tanto a nossa alma que viver sem ela está fora de cogitação. Melhor do que terapia, não precisamos remoer o passado injusto.
     Terapia já, de poesia, é claro... 
    




  
    

sábado, 28 de abril de 2012

DECLARAÇÃO DE AMOR

     Poderia ser uma declaração de amor à Terra, nosso planeta tão castigado, principalmente pela indiferença dos homens. E amo tanto este ser vivo que nos acolhe, nos alimenta, nos sustenta. Uma declaração de amor à natureza! E este amor faria brotar a esperança e ampliar  o entendimento de todas as coisas, pois  como dissera um monge tibetano: " A Natureza é o único livro que eu preciso ler."
     Dizer do meu grande amor pela própria vida, que nos dá a oportunidade de nos desenvolvermos, de progredirmos, de nos aperfeiçoarmos. Abençoada vida! E assim, recordo-me de minha mãe, sempre pronta para ajudar; criatura maravilhosa que me impulsionou para a concretização de ideais sonhados. Forte, destemida, arrojada. Tudo o que realizou em vida foi sempre objetivando  o bem.
     Eu também__ e por que não? poderia declarar um sentimento exacerbado por algum homem belo e gentil  que me fizesse ouvir sinos a embalarem sonhos de amor.
     E por aí perco-me quase, a desenrolar o fio das recordações que fazem o coração pulsar acelerado pelo arranque do amor. Pessoas queridas que enriqueceram a minha vida. A família, os parentes, os mestres, os amigos.
    Mas esta página dedico a um outro ser. Sim, faz parte da família, porém, chegou há pouco. Seus olhos me remetem a um tempo passado, quando tudo para mim era uma doce ilusão. Seu olhar traz uma pureza, uma brandura que toca a pureza que existe ainda lá dentro do coração. Mexe com a profundeza do meu ser.
    Sua ingenuidade provoca um sentimento dilatado de amor. Traz à tona aquela alegria deitada no fundo do poço... Mesmo sendo pequenino, cresce em minha mente a sua imagem. Cresce e sua figura alegre e brejeira ilumina meu coração , tomando-o completamente. Ele é a própria poesia que a vida me deu.Uma poesia feita por minha filha em parceria com o meu genro...Mas a sua alma, vinda de outras esferas faz repercutir em nós o som mavioso  da vida!
      A cada minuto, sua presença é tão viva e tão marcante que as palavras soam fracas, débeis sons quase inexpressivos. Não conseguem capturar toda a grandeza desse poema que é meu neto!  Sempre " Nos lábios um sorriso de alegria..."(*)
     " Pouco me importam dores já sofridas..." (*) Sinto-me renovada e feliz.


...
"No fundo de um poço
deitei a alegria
dizendo-lhe: 'Espera,
que volto algum dia,
com louros e rosas,
Amor e Poesia."
...

(trecho de A Alegria, de Cecília Meireles)


(*)trechos de poemas de Renato Travassos
    

sexta-feira, 27 de abril de 2012

ÁGUA + CONHECIMENTO

     Dizem os cientistas que o nosso corpo minguará sem água, principalmente o cérebro. Estudos e pesquisas são feitos intensamente sobre o cérebro. Sabe-se pouco, ainda.
     Li esta reportagem numa dessas revistas que vem cheinha daquelas informações que em breve esquecemos. A chamada cultura inútil. É a minha preferida quando viajo, pois não pesa, é pequena e, portanto, prática. Li no avião.
     Até que esta edição, além das piadas e informações perfeitamente dispensáveis, chamou-me a atenção. Nunca estivemos tão focados na saúde, na prevenção de doenças, no mistério da vida e da morte.
    Há incoerências na humanidade atual. Fala-se em corrida matinal para manter-se a forma e bebe-se cerveja no fim de semana (dentre outras preferências, piores e mais danosas); fala-se em prevenção da Aids e se esquece da camisinha (abrindo  parênteses, sempre achei esquisita esta história. Não seria bem melhor cada um de nós escolhermos alguém e com esta pessoa  vivermos as delícias do sexo e da vida a dois, incluindo a parceria, a compreensão, a tolerância, a boa vontade, a amizade, enfim, o Amor? Amor... tão cantado e tão mal resolvido nos corações... não sabemos nem amar a nós mesmo!?...quanto mais o outro...)
     Os pinguins, dentre outros animais, são bem resolvidos nesta questão. Escolhem uma parceira e pronto. Está formada a família para toda a vida. Coisa linda!...
     Vi um filme chinês há algum tempo, que me despertou. Realmente, os homens são inquietos, sua natureza é incontrolável. Desviam-se até das próprias convicções, deixando-se atrair por outras. No filme, o homem ao longo da vida, ia 'colecionando' suas esposas; à medida que elas envelheciam, ele procurava outra , mas não despedia a anterior. A ex-esposa contentava-se em permanecer na casa, junto à nova mulher, ajudando-a em alguns procedimentos. E todos viviam felizes para sempre.
     Leio agora um livro onde as ideias de Nietzsche são dissecadas, talvez com o intuito de atingir um público maior, para que o cérebro não derreta de vez. Água, estudo e bom pensamento__passeio da alma, tornarão o cérebro saudável, longe daquelas terríveis doenças ainda incuráveis__ temor de todas as criaturas de idade avançada, já que conseguiram vencer as barreiras dos micróbios, dos vermes , dos virus, das bactérias, da poluiçao e dos acidentes de toda espécie.
     E é um pensamento deste filósofo que deixo aqui para reflexão:" Nosso tesouro está na colmeia de nosso conhecimento. Estamos sempre voltados a essa direção, pois somos insetos alados da natureza, coletores do mel da mente."
  

quarta-feira, 25 de abril de 2012

INCOERÊNCIAS

     Às vésperas da minha volta ao Rio de Janeiro, comungo com os pássaros e canto alto as  minhas incoerências. Cedinho, a passarada estridente chilreia por entre as folhagens espessas das árvores enfileiradas aqui da rua. E eu, a tudo observo, calada.
     Vontade de ficar, de brincar mais com o netinho, de rever os amigos poetas baianos, com os quais criamos vínculos de admiração e de amizade. Ouvir suas trovas bem construídas, seus haicais libertados, sua poesia forte e repleta de sentimentos.
     Mas o tempo urge. Passo pelo tempo de maneira mais rápida do que gostaria de passar. Deixo alguns corações tão saudosos quanto o meu, que já dá mostras de cansaço. 
     Retornarei a minha Ipanema querida, cenário dos meus dias, em que recuperei alegrias então perdidas e sonhos desgastados. Quando o táxi  que tomo no aeroporto passa pela Lagoa, fico absorta, vendo todo aquele esplendor de natureza. A cidade do Rio de Janeiro é mimosa, agrada os olhos e o coração.
     O que dizer, então, da Pedra do Arpoador?  Sempre ali meditava, ouvindo a cadência do mar e o canto dos pássaros. Até um quero-quero juntou-se a mim, certa vez.
     Quando penso nisto que me espera, os amigos, os grupos aos quais me dedico com a alegria de uma adolescente entusiasmada, renovo a esperança de que conseguirei com tranquilidade me distanciar por algum tempo daqueles com os quais tenho vínculos de família e que amo de paixão.
     Mas sei que, ao chegar ao Rio, aos poucos serei invadida por uma ansiedade atroz de revê-los, de tocar neles, de ouvi-los pessoalmente, não mais por telefone ou skype... Uma vontade danada de acompanhar de perto o crescimento do netinho, suas peraltices e seu progresso. De saber dos planos e verificar o entusiasmo do meu genrinho, de apreciar a face bonita e serena da minha filha, ver com alegria a sua maior realização, a sua intensa dedicação amorosa, o seu mais afortunado título: Mãe! 
     Viver o presente é a solução adequada para nos mantermos em equilíbrio, com saúde e alegria. Controlar essa força chamada ansiedade não é fácil, especialmente quando estamos envolvidos pelo sentimento do amor. Fazer com que o amor se destaque de outros sentimentos é a tarefa a que me proponho no dia a dia.
     Parceria com a alegria e total dedicação à vida, do jeito que ela se apresentar__ este é o roteiro de uma mulher com os pés no chão e o coração alado!...
    
                       (pintura em tinta acrílica, s/papelão da praia do Diabo, Arpoador)
www.flickr.com/photos/sylviapoetisa


segunda-feira, 23 de abril de 2012

FIO DENTAL

      Final de tarde de um domingo preguiçoso, que se estende no calor de um outono com marcas de verão pelo sol teimoso, que demora a se entregar ao horizonte... Cenário quase constante em Salvador, na Bahia, assim como em outras privilegiadas cidades brasileiras.
    Como arrematar este dia gostoso, para a gente sentir saudade depois?
    Após a alma ficar embebida destes cenários grandiosos (na Bahia tudo é grandioso!), a rota é simples: Cafeteria da Livraria Saraiva, no Shopping Salvador. O café bem servido aquece e revigora. Junto à família, tudo é festa e alegria para comemorar a vida.
    Recebemos a senha e, enquanto esperávamos, folheamos revistas e livros das estantes dali perto. Mas logo fomos convidados a sentar. Ajeitamo-nos nas cadeiras. Distraídos, animados, felizes.
    De repente,  deparo-me com uma cena chocante. Um fio dental__não, não me refiro ao biquini__ longo, as extremidades enroladas avidamente por dedos nervosos de um homem, vai à boca  com sofreguidão, se contorce várias vezes aflitivamente, retirando pedaços, farelos, fagulhas, restos de comida dentre os dentes. Triste e conturbada figura!
    Na hora achamos muita graça. Parecia uma cena de um filme  trash. Esperei, atenta ao penoso espetáculo, já que estava bem à frente deste senhor. Esquálido, estranho, olhar parado no espaço. Ao seu lado, na mesinha, nenhum lanche; somente uma pilha generosa de revistas aguardava sua atenção. Observei, curiosa. O homem iniciou sua leitura. Mas o que eu via? Não lia! Somente folheava, nervoso, quando, repentinamente, colocou uma das mãos no bolso da calça e de lá tirou outro pedaço de fio 'para talvez finalizar a limpeza dentária', pensei.
    No final do processo, jogou, como fez anteriormente, o pedaço da fita no chão, ao lado da parede; não satisfeito, enfiou o indicador na boca com a habilidade de um artista circense , rodou, escarafunchou, levou-o ao fundo da boca, trouxe o dedo mais à frente e, finalmente, depois de certificar-se com a língua de que a  toda a boca estava em ordem, passeou o dedo na revista e voltou a folheá-la.
    Costumo sempre levar comigo na bolsa (bolsa de mulher...) gel para desinfetar as mãos no caso de fazer algum lanche ou mesmo uma refeição na rua. Agora, também usarei antes de folhear revistas...
   
   
    
    

segunda-feira, 2 de abril de 2012

LIVRO INFANTIL É COISA SÉRIA!

       Dia Internacional do Livro Infantil!... É hoje. Para nós, adultos, seria uma excelente leitura. Iríamos voar pelas asas da imaginação com a pureza e a ingenuidade próprias das crianças.
    Faria um bem enorme nos despojarmos da intolerância, da pretensão, da vaidade, dos sentimentos pequenos que nos impedem o avanço. A criatividade fica acanhada quando a arrogância e o orgulho direcionam a jornada do escritor.
     Vejo isto acontecer amiúde e me entristeço. Espano a sombra do desalento com a vontade  de prosseguir.  
       Tão bom aprender com a meninada a simplicidade! Resgatarmos aquela curiosidade, aquele interesse ; querermos descobrir coisas novas e, assim, estimularmos  o nosso apetite pela vida!
     Há muitos anos, quando caiu-me às mãos  Ou Isto Ou Aquilo meu coração vibrou. Acho que isto é o que está faltando:vibração!
     O olhar ávido descortinava a poesia, de fato. Nada se compara ao lirismo e à pureza dos versos de Cecília. Incomparável artista, de uma delicadeza magistral, compunha versos como uma harpista. Era uma artesã da palavra e das idéias. Deixava a palavra soltar-se e, ao mesmo tempo, a conduzia como uma maestrina, com indizível perspicácia, como se a palavra, e somente ela, existisse, livre de todo comando.
     No final de 2010, publiquei um livro de poesias para crianças (dos 8 aos 88!). A maioria eram poesias que já tivera feito há um bom tempo. E fui deixando de lado. Porém, com a chegada de meu netinho, inspirada, decidi-me a lançar Na Trilha da Poesia.
     Aqui, deixo um dos poemas:

    AMULETO
Hoje consertei uma corujinha tosca
Feita de conchas roxas:
Colei sua asinha que estava quebrada
E seu olhinho tão peculiar...
Hoje consertei meu amuleto
Feito os pés de graveto
E o corpo de duas conchas do mar...