domingo, 10 de novembro de 2013

EIA, SÔDADE !...

 
    Aos domingos, costumo ver e apreciar um dos programas da TV que mais me emociona. Refiro-me ao Viola Minha Viola, da cantora de música caipira de raiz, a grande Inezita Barroso.
    Sem dúvida, estas composições, em que inspirados poetas do interior do Brasil criaram, já são raras. O que se vê e ouve como músicas sertanejas são verdadeiros shows pictóricos, alguns com exibições prá lá de estranhas, artistas 'voando' sobre plateias alucinadas... Rebolados insinuando atos sexuais, caras e bocas nada dizendo e milhões de reais circulando e assim, incentivando  cantadores a enveredarem por estes caminhos.
    Valores perdidos, ficamos meio empobrecidos. Mas Inezita lá está, à frente de um dos mais belos programas em que a sensibilidade está presente, recuperando a memória dos autores que deixaram verdadeiras obras primas no nosso cancioneiro.
    Neste domingo fresco ainda, depois de percorrer numa caminhada leve a orla belíssima de Copacabana, chego em casa, preparo o meu café e ligo a televisão. Lá está ela, sempre simpática e otimista, com seu jeito peculiar: Inezita Barroso, a grande dama da música, que canta as belezas da Mãe Natureza, das flores , das aves, do sentimento caipira e apresenta uma lista infindável de gente criativa desse Brasilzão.
 
    Súbito, eis que a ideia da saudade irrompe do meu coração e escrevo:
 
 
Domingo... Eita dia marvado
Sôdade invade o peito
Pra arrancar o coração...
 
E o pobre do coitado
Agoniza, atordoado
O peito esvaziado
Sente farta do amô...
 
E pregunta a toda gente:
__ Cadê a felicidade?
__ Foi-se embora, meu sinhô...
 
No campo todo lavrado
Com as águas de tanta dor
Ao invés do coração
Brota um canteiro de frô...
   

sexta-feira, 1 de novembro de 2013

JOVEM CORAÇÃO

    Tento lembrar-me de algum fato engraçado acontecido recentemente para contar-lhes; não me recordo de nenhum... Também evito discorrer sobre a violência e outras mazelas da nossa sociedade, pois isto não me é permitido pelo tanto de bom senso que existe em mim. As notícias ruins já nos mostram às dezenas nos telejornais , com apuradas minúcias.
    Hoje um garboso rapaz me chamou:
    "__ Jovem, oh, jovem... "
    Com um folheto nas mãos, estava à procura de frequentadores para a sua Igreja...
    Sorri agradecida _ mais pelo "jovem" e dispensei o convite. Estava cansada, com embrulhos e não pude dar-lhe  atenção maior.
    Comprei um livro infantil que fala de pássaros, escrito por uma jornalista conhecida; porque é infantil eu não descobri ainda. Estava ansiosa para chegar em casa e me debruçar na refrescante leitura.
    Sempre há uma saída, afinal, para que tenhamos ainda a possibilidade de sonhar. A Natureza nos embala e é o nosso verdadeiro meio; já  digo isso há um tempão, acho que desde que me entendo por gente.
     Existem muitas verdades que poderão ser absorvidas se , simplesmente , explorarmos o ambiente natural; muitas lições, muitas conclusões acerca da vida e do comportamento equilibrado. Cada um que perceba por si. A Natureza nos ensina silenciosamente.
    Muitas coisas na vida acontecem e nos dão prazer, outras, nós fazemos acontecer. Costumo pensar nisso quando, momentaneamente, percebo que poderia gozar de uma alegria extra se alguém falasse assim ou assado... se alguém fizesse isso ou aquilo... se alguém me amasse do jeito que imagino...
    Então me recordo do querido médium Gasparetto que, certa vez, num programa de televisão, garantiu que sofremos da doença do " qué qué qué..." Esses desejos que nutrimos no coração e que, muitas vezes, dependem do outro para que sejam realizados tornam-se um tumulto. Então, para que nos atormentarmos?
    É um modo de prisão também, prisão da consciência que, somente libertada, percebe a felicidade em si. 

        
 

sábado, 12 de outubro de 2013

DEPOIS DAS TAPIOCAS, À ESCRITA!

    Pediram-me para que escrevesse, logo hoje, 'Dia das Crianças', pensei. Coloquei cartucho novo__ e nisto eu demoro bastante, já que nunca irei me familiarizar com estas tecnologias, eu acho.
    Fotografei o pássaro  no prédio vizinho, antes que o dia se esgote e saboreei duas tapiocas quentinhas, feitas por mim, enroladas como panquecas, com recheio de queijo de Minas e melado.


    Liguei o computador e tento escrever algo interessante. Recuso-me a dissertar sobre a meninice, da qual ainda tenho saudade. Tento não desfiar as qualidades do infante, a sua pureza e a destreza para viver com naturalidade e alegria. Aprendo no meu dia a dia com eles.
    A simplicidade  e a alegria são condições para abocanharmos a tal da felicidade. Não são as coisas que a determinam, não. Não são as conquistas materiais, não. É algo mais. É a conquista de si mesmo.
    Espalho meus livros de estudo, compêndios raros e me debruço sobre eles que me dão companhia e um certo conforto. Sinto prazer quando os leio e medito em suas lições. De acordo com os mestres, leiamos por uma hora, meditemos por duas e relatemos em três. Somente assim gravaremos em nossa mente e em nossa alma o que estudamos. Não basta passarmos os olhos, como se diz.
    Mas fora os livros, se nos detivermos na explosão da Natureza ,  absorveremos aprendizados fecundos; ou, então, se nos entregarmos ao sorriso e à alegria pura e viçosa das crianças.
    Aqui fica a dica para mostrarmos a nós mesmos que é possível conquistarmos a felicidade, este estado de espírito que permite a cura, a elevação da alma, a distribuição generosa dos melhores sentimentos. Aliás, ouso afirmar que a felicidade já vive em nós, no mais profundo de nossas almas.
    A preocupação com o futuro também nos oprime muitas vezes e nos confunde; a sabedoria está no agora! Mergulhar no momento em que vivemos, que é único!
    O mundo borbulha de ilusões. Porém, a inquietude é salutar, à medida  que nos favorece a percepção de fatos além da nossa atmosfera e à procura incansável da realidade.
 
Para fechar este artigo, deixo o poema PUREZA, de minha autoria,  como desfecho deste dia especial, em que recordamos a importância de que prevaleçam em nós, ainda,  um tanto da vivacidade e da inocência infantil:
 


                                             
                                                  Aquele negrinho que vi por minutos
                                  Ria...
                                  Por dentro eu chorava,
                                  Pois ele não compreendia
                                  A real situação
                                  Naquela sua euforia:
                                  A miséria o confortava
                                  A fome o conduzia
                                  O frio o enregelava
                                  E ele sorria, sorria...

quinta-feira, 12 de setembro de 2013

FELIZ ALÉM DAS LIMITAÇÕES

    Já pensei em fazer um novo blog sobre a terceira idade... Mas, pensando melhor, percebi que esta 'casta' ficaria ainda mais isolada do que já é.
    Esta maneira de tratarmos os idosos como 'melhor idade', terceira idade', 'idade da felicidade'  não deixa de ser uma exclusão. Seria medo de admitirmos que a velhice chegou? 'Idoso' seria a palavra correta, sem rodeios, nem atropelos, muito menos inibições ou complexos, acanhamentos.        
     Mas sabem o porquê? Presumo que o motivo seja o massacre do velho pela sociedade com o alheamento da sua presença  ou ainda, com a zombaria, infelizmente.  Os menos agressivos têm piedade... Ora, ora! Pena de quem viveu tanto? Pena de quem socorreu, pariu, criou, educou, semeou, trabalhou, riu, chorou, caiu,  enganou-se, aprendeu, levantou-se, enfim, alguém que, ao longo do tempo, amealhou experiências? Acumular mocidade não é para qualquer um.
    Somos todos muito frágeis. As doenças de toda a espécie, a violência, a ira que consome e a ignorância são fatores determinantes para que a vida seja encurtada.
    Os idosos são, portanto, sob o meu ponto de vista, vitoriosos. E deveriam ser tratados com carinho, respeito, amor e atenção. Os jovens ouvindo e aproveitando a sabedoria dos velhos se tornariam melhores e a sociedade passaria a refletir menos injustiças e incoerências. Tornar-se-ia mais pacífica, menos trevas, mais luz!   
    Sei que a velhice não consagra ninguém; mas nesta fase da vida seria bom admitirmos que a felicidade pode ir além das limitações. Misturarmo-nos aos jovens, às crianças, a todos! Aprender a trocar também com a juventude e com a criançada! Por que os grupos insulados? Não, creio que esta não é a maneira correta para a vida que ainda temos para viver! Procurar estabelecer laços de simpatia, renovar  amizades e alegrias, descobrir novidades, pequenas coisas, andar com menos pressa... Prestarmos atenção a nós mesmos! Usufruir a beleza da vida, o perfume das flores, a magnitude do mar, o contentamento dos pássaros! Descobrir do que gostamos de fato e mergulhar neste universo ainda desconhecido.
    Estávamos acostumados a um certo estilo, hábitos que foram sendo reforçados ao longo do percurso; mas podemos mudar isto! Vamos usar a nossa inteligência para vermos de maneira prazerosa as possibilidades que estão à frente e à volta. E a vida poderá nos surpreender.  
    Noutro dia, estava num ônibus e um senhor, aparentemente de idade avançada, um tanto inseguro, aproximou-se do trocador e pediu para que o avisasse quando estivesse perto do Arpoador. E concluiu, com simpatia, que queria apreciar o pôr-do-sol do calçadão, pois era um momento mágico! E explicava, já se animando, que podia fazer isso agora, na velhice, pois não tinha mais as obrigações de antes.
    Não me contive, como boa descendente de italianos que sou. Elogiei sua atitude, seu esforço, que seria, certamente, muito bem recompensado. Então ele discorreu sobre um passeio que tinha feito há poucos dias , no Jardim Botânico, à noite , para serem vistos animais de hábitos noturnos que vivem lá no Jardim. Entusiasmei-me! Este homem, aos poucos, mudara a rotina de sua vida. E estava feliz!...
 
 

   

terça-feira, 3 de setembro de 2013

CADÊ O PERFUME?

    Setembro, mês das flores, sempre bem-vindo. Mas ando assustada com todas as diferenças de temperatura. O tempo anda esquisito,  meio temperamental. Nunca tivemos um frio tão intenso aqui, na cidade do Rio de Janeiro, como neste 2013.
    O resultado dessas variações bruscas e temperaturas baixas são as gripes, as viroses, as conjuntivites e várias manifestações doentias.
    Seguramente, a estação temperada que aguardamos, ansiosos, virá com um sol ameno, tardes bonitas, manhãs esplendorosas e brisas suaves. Torço para que aconteça.
 
(lírio)


    Estava me preparando para conhecer Holambra, a cidade das flores, mas, depois de enfrentar uma dessas gripes tremendas, acho que perdi o fôlego. Teria que enfrentar pacientemente horas num ônibus para chegar à cidade; para irmos, há o sabor do desconhecido e tudo enfrentamos; mas... e a volta? Não, não, desisto, eu acho.
    As flores também não estão mais as mesmas. Compro na florista aqui perto e dura por volta de uma semana uma rosa. Recusa-se a abrir totalmente, não exala perfume, somente a beleza fria e triste. As rosas vendidas na feira são a mesma coisa. Só têm beleza, nada mais. Uma beleza, nota-se, forçada, mentirosa. São as flores de estufa, disse-me um vendedor de um quiosque da pracinha.

(Roseiral do Jardim Botânico do Rio de Janeiro)

    Não eram essas as flores da minha meninice e da minha juventude; lembro-me de que quando professora, havia um aluno que  quase todos os dias trazia uma flor! Geralmente uma rosa do seu jardim. Como era perfumada! E linda. Tive que providenciar uma pequena jarra e todos os alunos apoiaram a ideia. Ela ficava ali, na minha mesa, exposta aos olhares de toda a turma. Era a mensagem da beleza e da alegria.
    Eu tento destacar o que é   belo e puro e verdadeiro; tento me ligar ao que me transmita paz e contentamento; tento afugentar as ideias negativas de que o mundo anda meio torto. Ele está um pouco diferente. Tomara que possamos entendê-lo melhor e perceber ainda as sutilezas que acariciam o coração, renovam as esperanças e dão forma aos sonhos.
   
   
(bastão-do-imperador)

domingo, 25 de agosto de 2013

VIVA A ARGENTINA!

    Sol das oito numa sexta-feira preguiçosa, eu me esparramo nas areias ainda frias  de Copacabana, ali, no finalzinho, quase na colônia dos pescadores.
    Pouca gente saboreando o dia. Ainda era cedo e até a véspera fizera muito frio. A proposta era aproveitar rápido, já que o tempo anda incerto e caprichoso. Céu de um azul intenso, águas relativamente calmas e eu usufruindo as delícias do cheiro do mar, do alvoroço das aves.
    Logo avisto uma senhorinha sentada num banco do calçadão, alegre, com sua pequena  máquina fotográfica. Cabelos curtinhos, já grisalhos, a mão esquerda protegida por um elástico escuro e um sorriso estampado no rosto faceiro que lhe dava brilho e transmitia alegria.
    Passei a reparar a cena que se desenrolava pertinho de mim. Primeiro ela inicia uma conversa com o vendedor de cangas_ uma atração à parte para qualquer turista. Depois de um tempinho, ela mesma, decidida, estica o braço e bate uma foto dele. Pronto! Havia conquistado um admirador, que grita, entusiasmado:"_ Viva a Argentina!" 
    Um outro vendedor, desta vez de chapéus, se aproxima, pois o colega o incentiva a chegar perto. E ela, sem cerimônia, pede que lhe tire uma foto com ele. E o abraça, sem titubear. Com a maior naturalidade. Achei o máximo esta atitude tão espontânea e sincera.
    Quando nos deixamos guiar pela inteligência, recebemos a vida com alegria, de braços abertos, sem choro, nem lamentações. Haverá sempre dois caminhos: o da alegria, promovido pela aceitação e o da ranzinzice, quando nos tornamos lamentosos, apegados ao passado onde tínhamos outro estilo de vida, mas, como o nome diz, já passou.
    Resta-nos  o poder da escolha agora, com as possibilidades que temos: sermos felizes ou infelizes. Às vezes, parece que nos acomodarmos reclamando é mais fácil_ não precisa de muito esforço, basta nos queixarmos. Enquanto que para sermos felizes de fato, apreciarmos a vida e darmos boas soluções às diferentes questões que se apresentam é imperiosa a  renovação das atitudes.
    Aproveitei bem a minha manhã: além do sol poderoso que me encharcou de saúde e alegria, pude constatar uma cena singela, mas que me fez pensar.
 
 


   
   
     

terça-feira, 20 de agosto de 2013

VENCER DESAFIOS!

   
 
 Estive perambulando pela praça, de manhãzinha. Cães, criancinhas, mendigos, os cadeirantes e as velhinhas que proseiam, proseiam, proseiam, todos unidos pelo poder do sol.
    Mas existem aquelas que ficam ali, paradas, indiferentes à vida que corre, ou anda ... O olhar fixo em algum ponto longínquo faz parecer que conquistou uma imensa quietude inabalável. As acompanhantes, por sua vez, as desestimulam de falar, pois ficam com o celular nas mãos, jogando sem parar ,um tanto inquietas, sem nem ao menos olhar com um pouco de atenção àquela pessoa que ali está, frágil. A moça, às vezes,  fala muito ou, até mesmo,  discute com as outras, sem freios na língua. A linguagem torpe, mesclada com obscenidades fez-me sair de fininho para não me meter e chamar a atenção de uma delas, em especial.
    Como seria a vida daquelas senhorinhas que já viveram tanto? Talvez tenham sido mães, quem sabe? Ou são avós, ou já deram muito carinho e se desdobraram em cuidados para com os seus?
    Penso, repenso e me aflijo. E me compadeço. Acho muito triste no final da vida estarem tão solitárias e tão dependentes de outros que não compreendem o que estejam sentindo; não percebem a oportunidade que têm de aprender e se instruir. Mas o meu sentimento não é de pena por isso. Vejo, em cada uma , uma estrela solitária brilhando por tudo o que já viveram, tornaram-se fontes de luz e sabedoria. Pena eu sinto de quem as deixa, à mingua; pena eu sinto de quem ridiculariza a velhice. Cada idoso talvez tenha se tornado fonte de luz e alegria, com o coração repleto de amor e compreensão. Mas muitas vezes o imaturo nem olha para o velho; não lhe dá a atenção que merece e necessita como qualquer ser humano; mas ele já passou por tantos momentos sombrios que não contabiliza mais o sofrimento, mas sim todo e qualquer momento de paz e alegria.
    A vida passa rápido. Lembro-me das palavras de Buda, cheias de sabedoria:
 
" Nossa existência é transitória como as nuvens do outono.
  Observar o nascimento e a morte do ser é como olhar os movimentos da dança.
  Uma vida é como o brilho de um relâmpago no céu,
  Levada pela torrente, montanha abaixo."
 
    Estão ali, as pobrezinhas, despedindo-se da vida, serenamente. Com o semblante descansado, fazendo pouco caso do cantar dos pássaros, das frivolidades comentadas ao redor, da preocupação estampada nos rostos  das silhuetas que passam, apressadas. Alheias a tudo o que as rodeia, sonham, talvez, pelas lembranças que nunca se exaurem; da vida que já viveram, dos amores que já as alimentaram. Agora, na atual realidade, sucumbem, aos poucos. Velhice é para ser saboreada. Descobrir novos rumos, vencer desafios! Velhice tem que ser descoberta, dia após dia. Fazer disso uma arte. A arte de viver no futuro sonhado. Muitas vezes, sem o marido, com os filhos longe com seus afazeres, se distanciando e/ou perdendo os amigos, resta-lhes uma certa esperança no porvir. Os espiritualistas, numa libertação da carne que oprime; os materialistas, aqueles que  em nada acreditam após a morte, desanimados, sem fé, pesa-lhes mais o tempo da terceira idade. Pensam eles que tudo virará pó.
    Acredito que no profundo de cada ser haja uma dúvida quanto a essa realidade causticante. E a dúvida alimenta e anima o espírito. Desejaria que abordassem a leitura dos povos mais esclarecidos espiritualmente pois o bálsamo da fé conforta no final da existência, faz o sorriso permanecer.
 
    " O que for a profundeza do teu ser, assim será teu desejo.
      O que for o teu desejo, assim será tua vontade.
      O que for a tua vontade, assim serão teus atos.
      O que forem teus atos, assim será teu destino." *
     
   
 
* __ Brihadaranyaka Upanishad  IV,  4. 5


sábado, 17 de agosto de 2013

A ESCRAVIDÃO É UM INSULTO À LEI NATURAL

    Entrei na locadora, ávida pelos filmes recomendados num jornal, que propunha algumas obras de ficção não somente  como entretenimento, mas, também, como fonte de ajuda ao vestibulando. Cada filme conta uma história em certa época importante da humanidade.
    Como em meu íntimo corre ainda o perfume do professor e do educador apaixonado por sua profissão, pelas possibilidades que tem em ajudar a reverter o quadro doentio da atual sociedade, mesmo sem estar atuante como antes, não perdi tempo e entreguei a lista à atenciosa atendente.
   Somente um não conseguiram encontrar: " A escravidão é um insulto à lei natural". De resto, como já tinha visto alguns, como Os miseráveis, O menino do pijama listrado e Lincoln, a lista resumiu-se a seis. Desta, selecionei três: O ano em que meus pais saíram de férias, O pianista e O nome da rosa, que se passa na época do Renascimento, eu creio.
    Enquanto a busca pelos filmes acontecia, percebi que um jovem funcionário do local escolhia no andar de cima um filme para exibi-lo no telão da entrada. Fiquei curiosa e atenta para ver qual seria. Certamente uma novidade interessante para atrair o cinéfilo.
    Mas bastou-me olhar e entristecer-me. Violência era o tema. Já o título conferia: Renascido do inferno, ou algo semelhante. Como o rapaz percebeu meu 'interesse', descreveu o assunto, empolgado. Disse-me que era a história de um homem que é traído pela mulher e, além disso, é morto por ela e pelo amante. Só que ele não morre; fica em coma e daí acontece toda a trama pavorosa. Mas o garoto contou isto de maneira animada, como se fosse uma grande coisa! Deu pena...
    "_ A senhora vai querer levar?"
    "_ Não, meu filho, para saber deste conto só preciso ler o jornal." As meninas que faziam o atendimento riram.
    E completei:" _ É assim que a sociedade é minada." Ver e saborear durante quase duas horas cenas de violência e maldade, quebra a consciência crística do homem. Pode acreditar. 
     

sábado, 10 de agosto de 2013

PREPARA QUE AGORA É A HORA...

     Tenho visto e observado muitos idosos. Aqui, neste bairro de Ipanema e também em Copacabana, na "Cidade Maravilhosa", são muitas as pessoas que já conseguiram passar dos sessenta anos.
    Aprecio, com uma certa inveja, os velhinhos e as velhinhas que, religiosamente, comparecem nas areias do Posto 6 para curtir o seu volleyball, bem cedinho. Discutem, gritam, levam a coisa a sério! É divertido ver aquela turma. Eu fico ali, na cadeira quase cativa, saboreando o meu coquinho, espreitando todos eles e me banhando de sol. Esbanjam alegria e companheirismo, apesar de todos os palavrões insultantes, à primeira vista.
   Para quem teve uma vida pacata, voltada para o estudo e a reflexão, para quem nunca os ginásios esportivos fizeram parte do seu dia a dia, fica difícil estabelecer uma mudança de comportamento; ate porque os amigos  amealhados ao longo do tempo serão do mesmo tom. 
    Mas insisto em apreciá-los! Faz um bem enorme saber que há idosos que não estão nem aí para a idade fisica; devem ter suas limitações, certamente, mas não ficam tricotando sobre elas, não perdem o tempo que lhes resta viver. E sabem viver! Porque estão tomando sol, alegres, saborendo seu coquinho após o jogo, jogando conversa fora, felizes. Ah, e paqueram...
    Infelizmente existem outros grupos de idosos, os que se deixam abater, os que se tornam  invejosos, os tristes, os deprimidos, os desalentados, os chorosos. Não sabem se rebelar, se adequar à nova idade. E difícil mesmo. Porque toda a vida passou muito rápido; e só entenderemos isto quando chegarmos a esta idade especial. Ja chegamos no futuro; além disso, existirá  a morte que virá, como ladrão da noite nos arrebatar o espirito.
    Então, penso... como se adaptar a esta nova etapa para que a vida não perca o brilho ? Anoto uma serie de benefícios que esta fase proporciona e me surpreendo com tantas opções! Ir ao cinema e ao teatro e pagar meia, ir de graça ao Jardim Botânico, não ter vergonha de agradecer um elogio que, porventura recebamos, usufruir do tempo esticado para novos interesses como a fotografia, a pintura, a escrita, a leitura. Ou ficar somente curtindo uma bela paisagem, ou dar voltas no quarteirão, viajar, fazer um rápido passeio, conversar, aprender a meditar.  Passar uma tarde incrivel numa livraria e descobrir poemas, descobrir novas maneiras de retocar a decoração da casa! Fazer uma pintura no apê para  uma renovada!...
     Pensou em mais alguma? Deixe registrado em 'comentários '.
    Jamais se deixar abater pela solidão! Os filhos estão criados, estão vivendo!... Seria bom estarem juntinhos? Claro, mas, às vezes, a vida não permite. Eles tem o seu trabalho, os seus filhos, as sua ocupações. Então, nos preparemos para receber, com atenção plena, o que ela pode nos oferecer paulatinamente, porque se tornou mais flexível, mais lenta, menos estressante. Entendermos isto e aproveitarmos. Estávamos tão acostumados à vida corrida, à série infindável de preocupações que, quando o seu ritmo diminui, tropeçamos em um monte de ideias quase desastrosas.  Temos, para o nosso próprio bem, uma tarefa maravilhosa: aprendermos a viver numa outra etapa da vida, completamente diferente. Olha só que estimulante!... Muitas vezes nós mesmos somos os responsáveis pela espichada ou pelo encurtamento da nossa vida.
    O rádio esta tocando uma música animada que eu rejeitava, mas não quero me tornar uma velhinha chata e ranzinza, afinal, sou vovó e quero ser atualizada: " Prepara/Que agora/ É a hora/ Do show das poderosas/ Que descem e rebolam( bem, cá entre nós, rebolar, ok, porém descer, aí complica)... uma tal de Anita está cantando...  Quem sabe é legal? Noutro dia, vi no programa Encontro, da Fátima Bernardes o grande e inesquecível Caubi Peixoto. E chorei... chorei... Acho que não por ele, em si,  mas  pelo tempo passado, pelo meninice quando eu o ouvia cantar no rádio com aquele vozeirão:"Conceição, eu me lembro muito bem..."Tempo bom, com mamãe, papai, casa de vila, quintal, sapotis do grande sapotizeiro do vizinho que se esparramavam pelo chão ...
    Agora é a hora! Vida bem vivida pra recordar, filhos, neto, amigos, o dia está lindo, possibilidades a descobrir! O que mais importa?
   
   

   

terça-feira, 23 de julho de 2013

O INESPERADO

    O cansaço já tomava conta de mim, lentamente. O tempo chuvoso, as manifestações de caráter político na cidade, a volta com o coração apertado de tanta saudade, tudo isso colaborou para que acontecesse um imprevisto.
    Chegando no aeroporto ao retornar da minha viagem à Bahia, entrei, como de costume, na fila da espera de táxi; porém, percebi que a fila não andava... não havia sequer um carro! Depois de transcorridos uns vinte minutos aproximadamente, perguntei aos rapazes que controlavam a espera e eles me falaram, então, dos movimentos que havia na cidade e, que, por isso os táxis ainda não tinham chegado. " Problemas no trânsito", dissera-me  um deles.
    Mas quando vi, no outro lado, um  estacionando, não tive dúvidas: aproximei-me  e indaguei se podia me levar para casa. O taxista, um senhor de aparentemente uns cinquenta anos, alto, meio gordo olhou-me de alto a baixo e perguntou qual o bairro.
    Depois da sua aquiescência, nos acomodamos e eu estava particularmente um tanto preocupada , pois trazia um quadro bem grande, presente da minha filha pelo meu aniversário. Este quadro tinha sido arquitetado por ela com muito carinho. É composto por algumas fotografias de flores tiradas por mim, escolhidas a dedo e dispostas com arte, envolvidas numa moldura especial. Portanto, todo o cuidado seria pouco para que não se fragilizasse. Durante a viagem de avião, A TAM cumpriu seu dever com correção. Protegeu o quadro que veio todo embrulhado com papel bem forte e, além disso, envolvido por lâminas de isopor. Restava agora o cuidado do taxista.
    Minha atenção maior era para com ele. A mala foi atrás, como de costume  e o quadro foi colocado na vertical, bem ao meu lado. A pequena bolsa preta no colo e a mochila verde,  que trazia a minha inseparável Canon , veio bem juntinho a mim, colocada no banco  no meu lado direito, com algumas guloseimas típicas da Bahia.
    Durante todo o trajeto este senhor colocou-me a par dos grandes movimentos aqui no Rio, suas consequências, o atravancamento no trânsito, a corrupção que assola o país ... E discorria sobre o comportamento equivocado do povo. Trabalho era a sua palavra de ordem!  E se anunciava como exemplo. Trabalhador, honesto, disciplinado, enfim, teria qualidades das quais muito se orgulhava.
    Confesso que, a princípio, até me distraí; mas, depois de algum tempo, aquele tagarelar começou a me atordoar um pouco. Queria o silêncio por alguns momentos; queria olhar a Lagoa sob a chuva fina, queria poder estar comigo somente. Mas aquele insistente derramar de palavras combatentes me impediram.
    Até que senti-me aliviada, pois tínhamos finalmente chegado. Paguei o que lhe devia, saltei, ele retirou a mala_ e eu sempre atenta para que retirasse o quadro com delicadeza; retirou o quadro comigo ao lado pedindo-lhe cautela! O porteiro, pressuroso, veio ajudar. E nos despedimos.
    Cheguei no apartamento ainda atordoada com tantas questões levantadas.  E foi então que percebi a ausência da mochila onde trouxera a máquina fotográfica!
    Até os dias de hoje_ e já se passaram uns quarenta dias, sinto saudade daquela que era minha companhia nos passeios solitários que vivenciava pelos jardins, pelas praias, pelas alamedas floridas, pelas ruas. Sinto sua falta. Com ela, registrei muitos momentos felizes, o nascer de flores, as ondas tocadas pelo vento, as árvores, as pequeninas plantas, os bichos, os pássaros, o nascimento de meu neto, o sorriso de minha filha.
    Há toda uma diferença entre o discurso e o ato. Falou tanto aquele cidadão em correção , educação e honestidade. No entanto, perdeu uma bela oportunidade de exemplificar tudo aquilo  que dissera. Resta-me agora o exercício do desapego...




segunda-feira, 22 de julho de 2013

COMO PÉTALA DE ROSA

    Ouço Liszt e me torno paciente, calma, aveludada como uma pétala rubra de rosa. Rádio MEC fm  sem parar  para amenizar ruídos inoportunos de fora. Truque antigo.
    Mas qual o barulho bom de ouvir? Pra quem gosta de eletrônico, talvez seja esse o tal. Agora, cá entre nós, barulho, barulho mesmo acho de que nenhum.
    Os helicópteros atordoam o dia todo em virtude da chegada do Papa. Por isto mesmo, o trânsito anda quase caótico, com um rumor estressante. Às vezes, a televisão está tão sem graça, que passa a ser somente um desagradável vozerio ululante e nada é distinguível.
    Mas ontem, à tardinha, o som melodioso de um sanhaço-de-coqueiro adocicou meu coração. Agarrado ao bebedouro de pássaros , sorvia a água açucarada enquanto trinava.  O beija-flor-tesourão, pela manhã, já tinha entrado no quarto e rodeou-me trinando seu canto curto e baixinho. Ah, aquele som foi demais! Não é à toa que os índios com toda a sua imaginação lhe conferem o poder de um Tupã-Tenondé!
    Falando neles, não é que voltaram agora, enquanto escrevo? Colibris, sanhaços e cambacicas disputando a água. Enquanto esvoaçam em torno, (en)cantam. Esse é o som que mais aprecio! Além deste, além de algumas composições melódicas, as vozes infantis que riem, as que falam seu próprio linguajar, seu tatibitate; mas as que choram a dor da fome, estas nos fazem tremer de angústia. Todavia também nos impulsionam a vontade para socorrê-las e envolve-las em amor e carinho. Sempre há os dois lados, tento refletir.
    O mundo fervilha de sons. Há um, porém , que não posso dispensar, pois sem ele não suportaria viver. E é difícil encontrar. Quando subo a Pedra do Arpoador e vejo aquela imensidão de mares, minha alma se deleita e é o  som do silêncio que percebo. " ... ficar em silêncio, apenas ser."
    Certamente essa percepção nos afasta da maldade, da ignorância, do sofrimento, nos facilita a interiorização, nos vitaliza e apazigua a alma. "... comungar com a natureza e observar em silêncio a inteligência que há em todas as coisas vivas. Ficar em silêncio e assistir ao pôr-do-sol, ouvir o ruído do oceano ou de um rio, ou simplesmente sentir o perfume de uma flor. No êxtase do silêncio e em comunhão com a natureza, deslumbramos a felicidade." Nesse som eu aposto!
 






   
   
   
   

domingo, 21 de julho de 2013

RUGAS? JAMAIS!...




      Tenho visto muitas notícias sobre operações estéticas que não deram certo, chegando o paciente a óbito, às vezes. Por que as mulheres, principalmente, insistimos em querer parecer jovens, quando não mais o somos? Por que esse afã  pelo elixir da juventude eterna? Será que é na juventude que abraçamos a felicidade e ela, com o passar dos anos, se esquiva de nós com a mesma ligeireza que tínhamos quando jovens? Por que , insisto, aparentarmos algo que já perdemos?
     Cabelos grisalhos, nem pensar... Rugas? Jamais! E os dermatologistas, com suas agulhas finíssimas, injetam nas pobres iludidas a última solução para preencher os sulcos inadmissíveis!... Sorrio. Ganham uma cara de bolacha, irreconhecíveis. Pobrezinhas .
     A sociedade é cruel mesmo, muito preconceituosa, ainda. Ontem, ao saltar do ônibus, ouvi uma ' gracinha', misto de deboche com azaração, de um rapaz esquisito, coitado, nem se dava conta da sua própria figura medonha, ria muito, de tudo ele gozava, falando alto, sentado no último banco. Não é porque é jovem que é bonito e atraente... Saltei mantendo a postura, a classe, procurando aparentar naturalidade como se não o tivesse ouvido. Mas doeu. Mulher é assim. Sensível quase ao extremo. Gosta de ser reconhecida sempre bonita, glamourosa, irretocável.
     Até operação para ser virgem novamente existe. Acho tudo isso uma grande bobagem. Mas tento aceitar o mundo moderno no qual eu vivo. Observo e tenho cá minhas opiniões e perguntas. Para quê um ser humano busca tanto a artificialidade? Que caiam por terra o falso para que o puro e o verdadeiro sejam realçados! Porque aquilo que é  autêntico é forte.
     Quando os meus cabelos começaram a embranquecer,  minhas amigas da natação clamavam para que eu pintasse. Diziam que eu era muito jovem e bela para que permitisse uma aparência envelhecida. Levei muito tempo relutando e fazia o discurso " de que era livre de tintas". Mas, o passar do inexorável tempo fez-me mudar de ideia. Aceitei a sugestão e pinto, até hoje, num tom semelhante ao original. Cremes e leve maquiagem sustentam a minha vaidade.
    E como não quero ser preconceituosa, admito que cada um siga o seu caminho de acordo com o que lhe faz bem. Simples assim. Como dizia   Madalena Léa* em suas palestras sobre a mulher: " ... Se a mulher quiser operar, opere! E haverá dois tipos de mulher idosa: a natural, a que aceita os desafios do tempo e a que fez plástica. Não deixará de ser idosa."


   *Autora do livro Quem Tem Medo de Envelhecer... Você?
    

terça-feira, 21 de maio de 2013

AVENTURA JÁ PELA MANHÃ

    Solicito a parada do ônibus , mas o motorista ignora o ponto e vai mais além. E eu reclamo:
    _Motorista, pare, por favor! Ôoo, motorista!...
    E ele segue, segue mais um pouco e, finalmente, para. Meio atordoada, pois nunca tivera  esta experiência, salto do veículo murmurando. E, na minha cabeça, eu já cogitava: " Poxa, não começou bem o passeio. Vamos ver o que mais irá acontecer."
     Um tanto temerosa , respiração ofegante, ajeitei a mochila e procurei prestar atenção aonde estava. Ora, ora, estava bem em frente à entrada principal. O motorista do ônibus em que viera certamente achou que eu era uma turista e quis ser amável. Eu caprichei no visual mesmo: óculos escuros, roupa despojada, tênis, mochila e um belo chapéu de abas largas, presente de minha filha.
    Costumo entrar pelo portão do estacionamento porque a Cafeteria vem logo depois; Mas respirei aliviada e atravessei atenta ao semáforo.
    Pronto! Agora, sim! Ar puro, verdes de todos os matizes, isto era garantido; o restante faria parte da minha aventura matinal no Jardim Botânico.
 
 
    Logo na entrada , a beleza da imponência das palmeiras imperiais; mais adiante, um barulho oco, estranho. Eram saíras-sete-cores descendo por um tronco e esvoaçando bem à minha frente. Não deu tempo para fotografá-las. Foram mais ligeiras do que eu.
   Um outro casal de pássaros não identificados por mim se embolavam numa penca de fios e concluí que deviam estar tramando um ninho bem aconchegante.
    E daí em diante foi um prazer continuado sem interrupções. As flores da ninfeias brotavam no lago do chafariz em tons de rosas e lilases; os pássaros em atividade cantavam; a saracura desconfiada corria da fotógrafa mais desajeitada do que ela; a borboleta preta com 'pois' azuis se destacava no tronco espesso; lágrimas-de-cristo derramavam flores pela fresca relva.
    Caminhava sentindo o abraço do sol enquanto a brisa passava, leve. Confirmavam a presença do outono as folhas secas distribuídas nas aleias e flores brancas brotavam de um cactos perto do pau-brasil  atraindo abelhas. Repentinamente, como uma despedida em grande estilo, uma revoada de periquitos com o seu típico estardalhaço, por cima das altas copas. Aquilo foi demais! 
    Arrematei o passeio com um gostoso lanche e, inesperadamente, na saída, uma árvore repleta de frutos! Conheci hoje um pé de caqui-maçã. Quanta fartura!
    A vontade era de continuar por lá. Voltarei em breve para sentir novamente a vida natural, a alegria dos pássaros, a quietude da brisa, as sombras protetoras, o farfalhar dos encantos do Jardim.
 
 
Quer ver mais fotos? Acesse: www.flickr.com/photos/smercadante
   
     
    "...
Eu não tenho filosofia: tenho sentidos...
Se falo na Natureza não é porque saiba o que ela é,
Mas porque a amo e amo-a por isso,
Porque quem ama nunca sabe o que ama
Nem sabe porque ama, nem o que é amar...
Amar é a eterna inocência,
E a única inocência é não pensar..."
 
(Alberto Caeiro)
   
   
 
 
 
  
 
   


 
 

segunda-feira, 20 de maio de 2013

SIMPLICIDADE

     O sono está chegando, a noite começando e eu insisto em escrever. O dia foi bom, sereno como todos os dias deveriam ser, para que não perdêssemos nossas energias em tribulações infindáveis que, muitas vezes, nós mesmos inventamos.
    O viver pode se tornar simples, porém nunca monótono; simplicidade não significa rotina, nem tampouco indiferença à vida que corre. Simplicidade é força da vida; é motor que gera energia e brilhantismo na mente e no coração.
    Esqueçamos os conceitos antigos, façamos uma varredura do mofo acumulado em nossa mente. Sejamos firmes e decididos pra engatar a marcha para o progresso íntimo que requer sabedoria. Sabedoria que será conquistada, pouco a pouco, sem pressa. Sem expectativas também. Será conquistada naturalmente.
   É o futuro de todos nós: o progresso moral. E isso dependerá do conhecimento que tivermos de nós mesmos. Como nos conhecermos verdadeiramente? É muito difícil, mas não é impossível.
    A verdadeira transformação íntima só poderá ser realizada a partir do saber íntimo. Até que todas as máscaras caiam, demora.
    Temos a tendência a acharmos que o outro é quem nos atropela com o seu orgulho, a sua incompreensão, a sua ignorância, maldade, vaidade... Mas o que importa de verdade é sabermos o que ocorre em nós. O outro é problema dele. Não adianta tentarmos revelar o outro porque não conseguiremos.
     Despertar a consciência já é tarefa que solicita a nossa atenção plena.Voltarmo-nos para o nosso íntimo descobriremos uma quase infindável torrente de emoções e  sentimentos que não percebíamos, na pressa, ou na tentativa ingrata de querermos desnudar o outro.Um equívoco comum.
     Arregaçar as mangas_ porque é um processo penoso, trabalhoso,que vale a pena se quisermos ir em frente. É um processo de relaxamento, atenção plena e coragem. Sinceridade!
    A meditação _ qualquer delas, é o método adequado para tal fim. Meditação, não concentração.
    Enfim, estas são  ideias nas quais acredito. Mas cada um terá o seu próprio percurso, o seu próprio entendimento , o seu próprio ritmo e, ao final, todos nós nos encontraremos mais adiante, sentindo o bem-estar daqueles que se libertam das rudezas da ignorância e do desconforto espiritual.

 
 
RELÓGIO
 
DIANTE DE COISA TÃO DOÍDA
CONSERVEMO-NOS SERENOS.
 
CADA MINUTO DE VIDA
NUNCA É MAIS, É SEMPRE MENOS.
 
SER É APENAS UMA FACE
DO NÃO SER, E NÃO DO SER.
 
DESDE O INSTANTE EM QUE SE NASCE
JÁ SE COMEÇA A MORRER.
 
(Cassiano Ricardo)

segunda-feira, 6 de maio de 2013

BLASÉE




    Dia desses me disseram que eu estava com um "ar blasée"; gostei. Soa bem o idioma francês.
    Hoje lembrei do fato e não sei mais ao certo o sentido que quiseram dar. Poderia estar eu com um ar de enfado pelo que  estava ouvindo ou, simplesmente, mostrava uma elegância de atitude que reportara a um certo estilo de comportamento refinado. Até agora não sei, realmente, o que quiseram dizer. Aliás, foi um amigo meu que, no auge de empolações metafóricas e discursivas, ao olhar para mim, saiu-se com essa.
    Na hora achei meio estranho, porém me detive ao som das suas palavras, simplesmente.
    Tinha ido àquela Cafeteria para um encontro de amantes da arte da escrita. Trocaríamos ideias, sonetos talvez, trovas, quem sabe? Alguns  haicais, muitos poemas. Mas não foi isto que vi nem ouvi. Um pobre debate em que as palavras sonorizavam vazios. Aqueles breves instantes me fizeram notar a carência e a solidão do ser humano. Tudo parecia  muito aquém do que previra.  
    De uns tempos pra cá passei a ser mais criteriosa. Procuro saber se valeu a pena o tempo que passei em determinado lugar, só, ou com alguma companhia. É um bom exercício de percepção para que não nos percamos em tolices que nada acrescentam à nossa existência.
    Ficar discutindo sobre técnicas de construção de poemas,  ficar mencionando os prêmios infindáveis recebidos em concursos, enaltecendo-se  e dificultando a participação dos outros colegas, que também queriam se manifestar ou, talvez, mudar um pouco o rumo da conversa que se tornara insípida e tediante, sem dúvidas, nos faz perceber quão distante nos colocamos do que seria empolgante de fato. Tantos poetas valorosos! Tanta arte sufocada.
    Tinha compromissos, mas deixei de lado, valorizei a poesia e o encontro com amigos. Mas o que vi foi um monte de egos desesperados para se fazerem reconhecidos e amados. Meu apartamento estava sendo pintado e precisava da minha presença para acompanhar o serviço.
    Naquela bela tarde de outono, não me seduziram, não me encantaram. Nem mesmo um pretenso admirador que lá estava conseguiu superar sua insegurança e timidez. Mas se tivesse ouvido poemas...ah! Garanto que sua voz expressaria o desejo do seu coração, porque o coração alimentado por baforadas de sonhos, certamente sente o apelo do amor.

sábado, 6 de abril de 2013

VIDA CHOCHA

    O filme começou e eu já vi logo que não me agradaria; era modernoso demais. Pobre, com uma linguagem deficiente, cenas insípidas, nada causava emoção.
    Logo no começo, quando percebi a enrascada em que me metera, minha memória voltou-se para A Noviça Rebelde. Que graça, quanta arte neste filme envolvida! Que boa lembrança! Bons tempos.
    Até que a personagem principal entra no banheiro, limpa a maquiagem das pálpebras, limpa, limpa mais uma vez, vai jogando os papéis que usou no vaso sanitário...E  eu pensei: "E o vaso na Argentina não entope?... Agora só falta ela sentar-se e fazer as necessidades."
    Não faltou. Mais de uma vez a cena nada bucólica se fez presente. Além do vaso entupir.
    Até o namorado que arranjou no final era sem graça. Uma semgracisse só. De sentir piedade.
    Mas o que senti não foi pena; foi, antes, um tantinho de revolta por estar ali, sentada, junto a dezenas e dezenas de senhoras , na tarde de um sábado delicioso, de sol ameno, céu azulzíssimo, colorê!... Não. Era demais.
    O filme falava da solidão a começar pelo nome da moça: Soledad. Tudo tão óbvio e sem tempero.
    Mas com o decorrer da história até que fui me afeiçoando à personagem, tomando gosto por aquela sua vidinha  morna, chocha; ao final,  declara ao namorado que era assim mesmo emotiva(chorava por qualquer coisa, exacerbava o sentir) e chorava porque gostava, quando ela gostava, ela chorava, que  esta era a maneira de  expressar  o seu grande carinho; então foi aí que me identifiquei com ela e surpreendi-me com algumas lágrimas que teimavam em deslizar pelo meu rosto. Não podia ser. Afinal, a maquiagem que eu tinha feito nas pálpebras iria borrar e eu teria que ficar um tempão no banheiro limpando, limpando, limpando... 
 


quinta-feira, 4 de abril de 2013

ALBERTO NA CABECEIRA

    Escrevo porque me conforta; e quem é que não precisa de um certo conforto no seu dia a dia? Conforto que ameniza os desencontros, suaviza a rudeza de alguns momentos provocados pela vida, que vai passando, passando. E, às vezes, nem nos damos conta de como passa célere!
    Hoje é um daqueles dias em que a emoção parece ter-se instalado de vez. Preciso ouvir o doce canto de um pássaro, com urgência; enfeitar a casa com a pureza das flores, apreciar o seu  colorido  e sentir o perfume.
    Hoje, repito, é um daqueles dias em que preciso de um abraço, do carinho sincero de um amigo, olhos nos olhos, sorriso espontâneo desabrochando sorrisos.
    Viver a vida com prazer, deixar que a brisa embarace os cabelos, entrar no mar sem medos,enfeitar a mandala do coração com os mais belos e puros sentimentos. Fazer pelo menos uma criança sorrir, ou, quem sabe, um ancião acreditar ainda no ser humano.
    Viver o dia de hoje seguindo em frente, refletindo no agora e nas inúmeras possibilidades de ser feliz, fazendo a felicidade; procurar manter a esperança como chama na engrenagem da alma.
    E tendo na cabeceira a companhia do mestre Alberto Caeiro, destaco versos como quem destaca versículos bíblicos que alforriam a alma sedenta de luz e expansão:
 
"Louvado seja Deus que não sou bom,
E tenho o egoísmo natural das flores
E dos rios que seguem o seu caminho
Preocupados sem o saber
Só com o florir e ir correndo.
É essa a única missão no mundo,
Essa _ existir claramente,
E saber fazê-lo sem pensar nisso."