quinta-feira, 14 de agosto de 2014

A ESCASSEZ DO AMOR

    


"...
O amor virá encher o céu e o azul, o abismo e a grande nuvem
E envolverá de vida o Amor como a morte ao mendigo."

(Augusto F. Schmidt)

    Dia frio, com chuva faz a gente se aquietar, pensar mais e escrever.
     A morte do grande político pernambucano e a escassez da água no sudeste são destaques do noticiário. Quanto ao político, a comoção é grande, principalmente no seu estado; quanto à carência da água, receio que o povo ainda não se conscientizou da grande enrascada.
     Desconheço alguma ação dos governantes para realmente solucionar tal catástrofe! Há que se ter cérebros desenvoltos , amor e muita vontade para resolver este empecilho para que a vida siga o seu curso.
     Junto a estes assuntos, pairam também outros, diversos. Um deles é sobre a escassez do amor. Do amor de verdade!
     Vejo que o coração se move de quando em quando; porém, aquele sentimento vibrante, de entendimento e dedicação, não consigo vislumbrar. Evidentemente, existem as raras exceções. Ainda bem!...
     Casais distantes, muitas traições, corações bloqueados fingindo gostar por diferentes motivos... E isto é triste. Muito triste.
     Em que momento o amor definha? Espera-se muito do outro. Às vezes, o outro não tem a qualidade tão desejada.
     O que dizer do homem que fala que gosta, mas cuja fala torna-se, ao longo do tempo__ plasmada na inquietude, na tola vaidade, no azedume dos complexos, na irritabilidade do orgulho desmedido, um som apenas, monótono e vazio? Pura ilusão que não aquece o coração, que só promove tristeza, melancolia e impaciência.
     Esquartejaram o amor verdadeiro. Aliás, quando me refiro ao amor , estou falando do verdadeiro, claro! Portanto, não darei mais nenhuma outra virtude à palavra 'amor', pois ele, o amor, já é tudo!
     Acredito que atualmente a vida possa ser mais rica, mais palpitante mesmo sendo vivida só. Cada vez mais a convivência torna-se difícil. É preciso que haja aquela boa liga nos corações, se é que queiram compartilhar a vida. 
     São gostos, atividades, interesses diferentes. E falta delicadeza, esta a palavra-chave: delicadeza. Um alguém que diz que gosta, mas provoca o distanciamento, pela atitude desatenta, arrogante e desrespeitosa está longe de conhecer o amor. Não sabe o que é gostar.
     Um poema de Manoel Bandeira intitulado ARTE DE AMAR, talvez explique a incoerência daqueles que dizem amar , mas magoam:

Se queres sentir a felicidade de amar, esquece a alma,
A alma é que estraga o amor.
Só em Deus ela pode encontrar satisfação.
Não noutra alma.
Só em Deus __ ou fora do mundo.

As almas são incomunicáveis.

Deixa o teu corpo entender-se com outro corpo.

Porque os corpos se entendem, mas as almas não.
    
    
    
    
    
    
    
    
     

segunda-feira, 11 de agosto de 2014

COMO O ÚLTIMO DIA

    
"...
Os seres que nos deixam saudades
São os que não sabiam que eram bons,
Que não suspeitaram que o mal andasse pelo mundo;
Os descuidados, os que chegavam sem ser convidados,
Os que adormeciam sem medo de sonhar,
Os que se recolheram na eternidade
Como se Deus fosse a sombra de uma árvore na estrada."

( Augusto Frederico Schmidt)




      Meu amigo perdeu sua mãe. Contou-me hoje por uma rede social; ela, que já sofria muito há algum tempo, descansa agora.
     Convenhamos que o corpo acaba, a matéria é desfeita e o espírito, que deu vida à matéria, livre, agora, se refaz.
     Guerreira que foi__ como ele mesmo define, sua mãe agora são lembranças no coração.
     A vida é assim mesmo: uma sucessão de perdas... No meu caso em particular, primeiro, foi-se o avô Pedroca__ chamado assim carinhosamente por vovó Ritinha; ela morreu logo depois, não suportando a ausência do amado; mais tarde, meu pai, que para sempre guardarei na memória como um homem bom, alegre, amante da Natureza. Seu  melodioso assobio, quando chegava do trabalho, parece que ainda ouço. Depois, veio a morte triste de minha mãe, uma ausência que jamais será preenchida, uma dor tamanha que nunca irei superar; e a de meus tios e tias , fortes figuras na minha existência.
     Amigas que partiram deixaram um vazio imenso na minha estrada. Tínhamos uma afinidade grande e nossos encontros sempre foram felizes.
          O que fazer? Seguir em frente e, cada vez mais, dedicarmo-nos ao outro. Somos todos uma família! A grande família da humanidade. Encontrar pessoas com as quais sintonizemos não é comum, não é fácil. Mas não será impossível.
     Tento viver agora como se cada dia fosse o último dia da minha vida. Evito reclamações, ilusões,  alterações de humor,  violência em qualquer aspecto, até num filme! Não vale a pena...
     A vida é um manancial de luz, de paz, de belezas, de maravilhas. Observar com atenção à nossa volta toda essa pujança nos dará um grande alento, uma grande e imprescindível força e confiança.
     Mergulhar na leitura que alimenta o espírito; saborear as mensagens dos mestres que nos trazem belas lições a nortear a nós, pobres caminhantes  combalidos pelas agruras que nos amargam o coração.
     E aprender, dia a dia, a amar a todos, indiscriminadamente. Pessoas, animais, plantas... Este é o meu  plano . Qual é o seu?





    
    

sábado, 9 de agosto de 2014

PANE NA NATUREZA

     Sentada, na expectativa da agulhada. Aquela agulha tão fina, entrando pela veia, retirando meu sangue... não acostumo com isso.
     A funcionária do laboratório percebeu o nervosismo e desatou a falar. Começamos pela seca em São Paulo, a grande ameaça da falta d'água!
     Quando me casei e adentrei pelos milagres das receitas culinárias, sempre afirmava que poderia viver sem luz, sem gás... mas sem água, seria impossível! De vez em vez, o porteiro nos avisava que iam racioná-la, então, eu me desesperava! Era um tal de encher baldes, vasilhas, banheira... Era um Deus nos acuda!...
     Agora, a ameaça é maior. Bem maior. Uma cidade inteira como São Paulo, sem água? Impossível acreditar.
     O assunto foi adiante;  a mulher arregalava os olhos, limpava o pouco sangue que ainda saía do meu braço e narrava: noutro dia, podou uma mangueira do seu terreno__os galhos estavam entrando no quintal do vizinho, explicou. Depois desse ato inocente, causou uma pane na natureza: muitos percevejos entraram em sua casa, passarinhos desabrigados  procuraram seus ninhos. E ela chegou a chorar, contou, já meio atordoada, revivendo o fato pela lembrança.
     E por aí foi descrevendo a atitude da natureza que nos oferta, nos consola, nos abriga, mas, também, se revolta e nos pune... Entusiasmada, relacionou com textos bíblicos e tive que tomar a iniciativa para sair, burlando o seu domínio discursivo...
     Talvez nós, pessoas comuns, ainda não tenhamos percebido a totalidade do avassalador impulso do homem cruel, ávido por lucro, por dinheiro. As matas sendo destruídas para construções, rios sendo mortos, sem nenhum constrangimento.
     Muitas pesquisas e recentes estudos mostram, por outro lado, que a humanidade está despertando e se unindo em prol do planeta, nossa casa Terra. Imperioso é que nos debrucemos sobre  qual a melhor  atitude no dia a dia, a pequena ação que interferirá ao final. Todos se unindo __ empresários, governo e o cidadão para que haja uma revolução de ideias e de ideais, com o foco na saúde do planeta, este ser vivo, palpitante. Afinal, dependemos dele, é a nossa casa que, generosa, tudo nos oferece para que tenhamos  vida de qualidade. E nós a maltratamos tanto?
     Desde a infância já é bom que comecemos a semear noções de amor à mãe-natureza. A leitura oportuna e as conversas serão bem-vindas.


TOQUES DE OUTONO

Os espíritos da natureza
Se manifestam na brisa que sussurra,
No vento que surge,
Cobiçando os verdes apaziguadores.

Pássaros atiçados
Voam assustadiços,
Gritam alvoroçados.
Somente o riacho continua, em sua rota inalterável,
Invadindo a floresta que, mesmo em silêncio, ruge.
Suculentos frutos
Debruçam-se nos galhos dadivosos
Do garboso jambeiro.
Os perfumes acentuam-se.

Na mata, a criação conspira.

    


    
    
    
    
    

sábado, 2 de agosto de 2014

"_LEVANTE O SOUTIEN!"

  
    "É neste que eu vou", decidiu, animada, quando procurava um cardiologista na lista do plano de saúde, pois o nome dele coincidia com o do seu pai e não era um nome comum. Este foi o critério.
     Tudo ia bem nas primeiras consultas, até que o médico revelou-se como pessoa. E aí foi um desastre...
     A taxa do colesterol dera alta; e ele , à guisa de que ela aceitasse o medicamento indicado, que produz diversos efeitos colaterais, tornou-se irritadiço, inconsequente, grosseiro.
     Alteou a voz , com o dedo em riste e direcionou-a para a pequena saleta onde realizaria um exame preliminar. Mandou-a deitar-se e levantar o soutien num tom agressivo, já que ela titubeava, pois a peça não era flexível, ela queria abrir atrás, mas ele mesmo, com o autoritarismo acirrado, puxou-o para cima , deixando-a numa situação constrangedora.  
     Após o exame, em passos largos e firmes, dirigiu-se para a sua cadeira e, em tom agressivo, disparou:
     "_ Venha pra cá!" , tendo ouvido como resposta, em voz tíbia e delicada:
     "__Um momento, doutor, estou me compondo."      
     A tremenda escassez de gentileza gerava palpitações na paciente. Não se preparara para tal encontro. Acreditava que ele era um bom médico. Ora, ora, mas o que é ser um bom médico? Talvez saber ouvir, saber diagnosticar, saber prescrever a droga correta e, antes de tudo, ter o entendimento que aquela pessoa, à sua frente, está carente de cuidados.
     Mas, por certo, às vezes, o médico está numa situação tão deplorável de valores, de compreensão, de empatia que não perceberá detalhes do ser humano. Mecanizou-se, tornou-se um robô para aviamento de receitas.
     Ao sentar-se, a paciente ouviu, repetidas vezes, que deveria usar a tal medicação, pois ela era já quase uma sucata!...
     "_ Como, doutor? Acho que não escutei direito...", falou, meio aturdida com o que ouvira. E ele repetiu, bombasticamente, com a empáfia de um pobre doutor...
     Depois, bramiu, entusiasmado, porque ela dissera " _Ai, meu Deus!",  que não acreditava em Deus, que  não acreditava em absolutamente nada, com a pose de quem faz uma afirmação muito perspicaz e inteligente.
      Bem, "agora, tudo está claro para mim", pensou ela.   Sentiu mais por ele do que por si, já que, alguém que não tenha encontrado seu próprio templo de quietude , está permitindo a agitação e o desvario, longe da paz e da força divinas.
     À porta, ele sorriu um tanto sarcástico e, à meia voz, pediu-lhe desculpas...
     Ela saiu dali meio trôpega, claudicante, pediu um copo d'água à secretária e, depois de assinar o recibo do Plano, desejou ali nunca mais voltar.
     Programou-se para caminhadas e segue uma dieta, nem tão rígida, de uma boa nutricionista. A meditação diária entrou no rol das novas atitudes e, de acordo com os últimos exames, a taxa do colesterol vai muito bem, obrigada!



 Ah, doutor impaciente,
que lança palavras mortas,
que planta dissabor...
Ah, doutor!...
Tão belo homem,
imponente...
Mas quebram o encanto da tua presença
a  língua indiferente, 
ferina, tonta
e o coração ausente...
Ah, doutor,
a Poesia se faz urgente!
Não lamentes a paciente que se foi...
Doravante, sê prudente!...