domingo, 27 de março de 2011

DIOGO & BARÃO

   Os dois heróis__ Diogo e Barão, aclamados neste domingo estranho, mormaço fervilhante ,  nublado, sujeito a chuvas e tempestades. Rio de Janeiro, praia de Ipanema, oito horas, mar meio agitado, quase ameaçador, engulindo o que via pela frente.
   Garrafas d'água, displicentes, pela areia escura. Corpos estendidos em panos coloridos. Passos apressados à beira do mar encrespado.
   Repentinamente, aqueles dois incautos  longe, tão longe... e um apito no ar. Céleres, Diogo e Barão correm velozmente. Já não são mais seres mortais comuns. Não. Crescem à nossa vista. Tornam-se heróis pela agilidade, firmeza , pelo raciocínio perfeito, competência nas águas turbulentas. Sabem o que fazer. São heróis do mar. NETUNO os respeita e abre as suas águas acinzentadas , os céus se alvoroçam e fragatas partem do horizonte rodopiando no ar e testemunhando tudo.
     Nadam e enfrentam, destemidos, as ondas avassaladoras. Até que chegam aos dois rapazes e os enlaçam com seus braços acostumados a salvar vidas.
   Diogo e Barão__ simples assim, de uma simplicidade comovente. Trazem até à areia os dois moços , avaliam suas condições e rumam pela orla, naturalmente, a colocar avisos em placas vermelhas: "Cuidado - Correntezas" . 
   Os pretensiosos, os tolos, os ingênuos  continuarão a dar sustos. Mas eles, os salva-vidas,  também estarão a postos, atentos ao mar e à vida humana.
   Esta é a minha homenagem a esses bravos heróis anônimos, força da juventude lúcida e disposta a fazer o bem sem alarde.


quarta-feira, 23 de março de 2011

CIDADE DE DEUS

   Visita, confraternizações, alegria, entusiasmo num bairro que, não faz muito tempo, fora motivo de medo e apreensão.  Obama e sua simpática família lá estiveram para comprovar a gente boa do lugar.
   Trabalhei no bairro da Cidade de Deus há muitos anos. Vivi um tempo em que as pessoas que ali residiam era gente trabalhadora, esforçada, que queria melhorar a vida. O grande número das casas simples, pequeninas, evidenciavam a classe pobre da população do Rio, que fora transferida de algumas favelas para o novo bairro. Pobre sim, mas determinada e esperançosa de um futuro promissor.
   Gostei tanto deste lugar que permaneci trabalhando ali por alguns anos seguidos, acompanhando turmas desde a classe de alfabetização.
   O bairro era tranquilo, a conduçao farta e segura _havia até Kombis da Prefeitura!_ a Escola ampla, arejada, construção moderna. E os alunos, ah...os alunos! Crianças queridas cuja lembrança afago até hoje no coração. Havia os engraçados, os artistas, os que chegavam atrasados e cansados, pois tinham trabalhado na feira ajudando a mãe, os confusos, os atrapalhados, os traquinas, os estudiosos, os quietos, os calados, os sofridos. Mas não havia  nenhum temido. Não! Todos, cada qual com seu jeito, sua história de vida, cada um deles com seus dons e suas virtudes eram como células de um organismo que pulsava harmônico.
   Eu sempre inventava passeios e a condução teria que ser gratuita. Eu sabia pedir! As Forças Armadas davam uma ajudinha. Não me importavam  as dificuldades. Aquelas crianças tinham ânsia de aprendizado, de vida, de alegria e confiavam tanto em nós, que não podíamos jamais frustrá-las! Além das aulas das letras e dos números, havia a de Conhecimentos Gerais, que abrangiam História, Geografia e Ciências, de Música, de Religião, de Educação Cívica, de Artesanato, de Recreação . Então, providenciamos os passeios para complementar o aprendizado.
   Descobri que muitas não conheciam o mar. Pois foram apresentadas a ele. Certa vez  viajamos na Kombi do padre da região! Íamos e voltávamos cantando, felizes. Foram vários os passeios: Fábrica de sorvetes Kibon, Museu do Índio, desfile do 7 de setembro em lugares reservados e muitos e muitos outros...  
   Guardo na memória ainda a sala espaçosa , a sólida mesa de madeira e o vasinho tosco diariamente abastecido de rosas . Pequeninas rosas do jardim da casa de um aluno nosso, filho de portugueses( as classes eram variadas: nortistas, nordestinos, cariocas, sulistas, portugueses e até um simpático coreano!), loiro, sorriso farto, bochechas rosadas.
   Agora existem também as Ongs que colaboram realizando um trabalho belíssimo e bastante diversificado. Porém, nos idos de 70, éramos somente nós, professores, que tratávamos de modo amplo da Educação e da formação do povo brasileiro na figura ainda frágil e ingênua das crianças.

quarta-feira, 9 de março de 2011

GOSTO, CRIAÇÃO, COLIBRI, CARNAVAL E PERFUME DO MAR

   Saí para um cineminha. Sala Laura Alvim, "A Última Estação", filme que narra o grande amor de Tolstoi por sua esposa e a reviravolta que ele mesmo dá nos últimos anos de sua vida. Não consegui. Lotação esgotada. Parecia um bom assunto, com consistência, diferente do que tinha pego na locadora para ver no aconchego de casa: "Borat", um lixo. Incrível ter ganho vários prêmios. Comédia escrachada demais para o meu gosto. Mas gosto não se discute.
   E falando nisso, como há tantos concursos artísticos? Tantos julgamentos? Criação não se julga. Técnica talvez. Mas a técnica muitas vezes oprime, reduz a fragrância, a fulgência, o brilho da criação. E essa não é somente a minha opinião. Alberto Caeiro(Fernando Pessoa) e Mário Quintana dentre outros nos advertem. 
   O artista exulta, vive noutra esfera, com sentimentos exacerbados no momento da criação, que será sempre  único e palpitante. Refiro-me à arte saudável, àquela efervescência, àquela ebulição do espírito.
   Mas o que eu  ia contar era que, por uma coincidência, estava vestida com uma camisa,  onde um colibri lantejoulado e beijando uma flor espetacularmente cor-de-rosa estampava a  malha branca. Justamente hoje, que foi declarada vencedora a Escola de Samba Beija-Flor! Muitos me olhavam, a camisa chamava a atenção. Como é natural do ser humano o julgamento, a conclusão precipitada, deviam estar achando que eu  comemorava. E pensar que passei um carnaval quase religioso...como num mosteiro, numa reclusão de fazer dó. Imaginei estar num retiro espiritual, em minha própria casa. Para diminuir a tensão. Sair em dias de carnaval? Não é possível. Digo isso porque as coisas mudaram. Para pior. Como já escrevi noutra página, muito lixo, pequenos furtos, bebedeira, uma loucura. Moradores de um prédio aqui desta rua limpavam hoje a frente com creolina... lastimavam tanta sujeira e fedor!
   Mas ontem, terça-feira, consegui vencer os temores e, mesmo com a chuva fraca, o céu cinza, fui fazer a minha caminhada costumeira. Ah! O cheiro revigorante do mar!... Precisava ir ao Arpoador, subir a pedra, sentir toda aquela magnitude e amplidão. E me surpreendi com muitas pessoas que, como eu, ali estavam, no passeio matinal, usufruindo das delícias dos ares da manhã fresca de Ipanema, que não mudará nunca.







  

segunda-feira, 7 de março de 2011

SOBRE O CARNAVAL

   Segunda-feira chuvosa de carnaval. Rio de Janeiro, cidade que já foi ' Maravilhosa'; hoje, restam-nos as lembranças dos carnavais de rua( e olhe que eu não sou saudosista), principalmente no centro da cidade, onde eu ia com meu pai apreciar  os fantasiados, os mascarados, os foliões, os blocos verdadeiramente alegres e inocentes('Ei! Você aí, me dá um dinheiro aí, me dá um dinheiro aí...´).
   Pela tv víamos os grandes bailes, Clovis Bornay_imbatível em suas criações e outros que se tornaram famosos por conta das fantasias. Eram momentos  que passávamos com a família, bebendo guaraná e beliscando os pequenos petiscos.
   Há poucos anos ainda vi algo que mexeu comigo: o Bloco dos Mendigos, aqui, em Ipanema. Tinha que ser. Em Ipanema tudo acontece... O bloco era incrível, animado e os mendigos das redondezas__ não sei como__ se organizaram e festejaram Momo!
   Hoje, os mendigos estão por aí (cadê a Prefeitura?) sujos, aliás, sujos somos nós que tomamos sorvete e nos lambuzamos, ficamos sujos; ou, li jornal e sujei as mãos...mas os mendigos estão imundos, deitados em cada esquina, fedidos, alguns catando latas de cerveja pra sobreviver.E haja latas de cerveja! Eta povo beberrão! E mijões. Na pequena saída que dei ontem ao mercadao,  três senhores(!!?) fazendo xixi no muro do Hospital de Ipanema, à frente dos transeuntes e dos seguranças do hospital! Que feiúra!
   Sexo, orgia, bestialidade, loucura, feiúra __este o carnaval dos tempos atuais. Com exceção de algumas cidades do interior, de Recife, onde ainda o frevo monopoliza a atenção e em Parati, onde estive em 2000.
   Algumas beldades(?) parecem verdadeiros monstrengos com suas bundas preenchidas  e seus peitos empinados e enormes. A delicadeza e a formosura já não estão mais na moda. Perderam a vez para a feiúra e a deformidade. E ainda pagam para ficarem tão distorcidas .
   Os homens estão estranhos. Cadê os homens educados, cultos, gentis? Agora são uns grandalhões bombados e, quando parecem normais, vivem tão estressados que não há quem os aguente!
   Na minha infância, morei numa bela casa de uma bucólica vila e, na época do carnaval, ia para a janela ver os fantasiados; o que me dava mais medo e , por isso, era o meu preferido, era o gorila! Como eu gostava de vê-lo! Ele dramatizava e todos nós ficávamos esperando por ele aparecer, todos os anos. Agora, não vejo mais isso, só vejo sujeira e alienação.
   Hoje cedo fui até o Caixa Eletrônico e me deparei com imundícies e fedentina. Ia voltar lá para fotografar, mas me detive, pois sempre foi meu objetivo encher os olhos e os ouvidos das pessoas de boas novas, de belas imagens. Então, desisti. E enviar para a Prefeitura, adiantaria?

    crianças cobertas de lama__tradicional brincadeira do carnaval na cidade de Parati