sábado, 10 de junho de 2017

SAIA JUSTA

    
     Tenho observado com cautela certos textos . E, confesso, causam-me estranheza e perplexidade!
     Absurdos de linguagem, ideias trôpegas, trocadilhos chamados com empáfia de poemas... Causam-me tristeza, isso sim!
     Arte, para mim, nos enleva. Ou, como afirmou o mestre Quintana, nos abala! Como a que estou a apreciar agora: a bela Habanera, interpretada  pela voz inigualável de Carmem Monarcha, com acompanhamento da orquestra do genial André Rieu.     
     Parei o que estava fazendo. Nada mais importava. Os barulhos cessaram, como por encanto. Minha alma ligou-se àquela beleza eterna. No caso, a arte em questão é a música. E fico a imaginar quanto tempo de estudo, de treinamento há que se ter para que o artista possa contemplar o mundo com o seu talento esmerado.
     Há um tempo atrás, indo conversar sobre Mario Quintana com jovens atendidos no IRS (Instituo Rogerio Steinberg),  distribuí alguns pequenos  trechos deste autor para o grupo. E a atitude de uma jovenzinha me tocou: ela leu em voz alta : " Para mim, um poema tem que abalar a criatura! ". Ela levantou os olhos sonhadores e retrucou: "__ Que lindo! Vai sempre estar comigo para lembrar-me."  E colocou no pequeno bolso da blusa.
     Dia desses, num grupo de pretensos escritores(!)de uma rede social, alguém menciona a grande vontade de viver no Brasil  da publicação dos seus livros de poemas... Quer ter sucesso! Quer ser reconhecido, aplaudido, considerado. Mas, na narrativa da ambição, quantos erros de Português!
     Minha memória correu direto para certa vez, quando uma pessoa que assistia um recital, me entregou alguns poemas de sua autoria e pediu a minha opinião. Veio simpático, garboso, confiante. Eu nem o conhecia. Tomei-lhe, então, das mãos firmes os papéis soltos, com escritos longos, a tinta.
     O nosso idioma massacrado, ideias chulas, textos pobres, sem desenvoltura foi o que vi e li. Postado ao meu lado, sorrindo, confiante, aguardava esperançoso. Pedi a sua confirmação: Quer sinceridade ou apenas elogios levianos? Ele continuou a sorrir e categórico, disparou: A verdade!
     Eu estava numa "saia justa", como se diz. Gentilmente , tentei mostrar-lhe o acúmulo de erros tanto ortográficos, como gramaticais e a possibilidade da abordagem dos assuntos de maneira mais elegante e poética.
     Enfureceu-se o homem. As bochechas, antes em tom ocre, agora vermelhas como um camarão! Os lábios crisparam-se. Suas mãos trêmulas tomaram os papéis e, com a voz rouca, comentou ligeiro que tinha feito o uso da licença poética! ... Calei-me. Percebi que não poderia haver diálogo com a criatura. Virou-me as costas e desapareceu, pisando duro...
     Este assunto dará panos pra mangas... Mas, por hoje, ficamos por aqui, pois as ideias avolumam-se e não pretendo entediá-los. Termino com citações do grande Quintana e, na próxima crônica, quem sabe Coralina terá voz?
 
     " Porque Poesia é insatisfação, um anseio de auto-superação. Um poeta satisfeito não satisfaz. "

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