sexta-feira, 30 de junho de 2017

ROTEIRO MODIFICADO

     Tarde  de um inverno magnífico, cheio de sol luminoso,  com um indescritível céu límpido. E azul de doer os olhos.
     Fui tranquila de metrô, como convinha. Um gentil vizinho acompanhou-me até a estação mais próxima, alertando-me sobre o incomum número de policiais no bairro naquela tarde. Sinal de perigo.
     "Volte logo e se tranque, porque no alto do morro está havendo tiroteio", disse-me ele, quase atropelando as palavras, no seu jeito um tanto atrapalhado pelo nervosismo. A ocorrência destes transtornos está cada vez mais frequente.
      Conformada, caminhei por aquele interminável sobe e desce da estação, desci em Copacabana, dirigi-me à loja de fotografia e busquei a foto  ampliada que tanto queria! Logo providenciei a moldura branca. Aprendo  na vida que não devemos postergar decisões. Se tudo está favorável, pra quê adiar? Resolvo de imediato.
 
     Decidi voltar de ônibus, já que há muito tempo não o fazia. "Andar de ônibus!", pensei, nesse meu romantismo quase tolo, Imaginei-me apreciando os alpendres dos antigos prédios de Copacabana, os arbustos esquálidos, porém floridos, os jardins dos condomínios mais conservados, exalando perfumes de magnólias... Em minha mente  por vezes fantasiosa, vi alguns pássaros acima das copas, esguios, buscando os céus.

(jardim num dos prédios da Rua Barata Ribeiro, Copacabana)
     No entanto, já no transporte escolhido, vejo-me presa num grande e execrável congestionamento. Algo repentino, aqueles ônibus como monstros expelindo das ventas alargadas fumaças  negras , chegando muito próximos uns dos outros, carros de passeio, taxis amarelinhos, caminhonetes , todos se juntando numa atmosfera de incrível poeira, monóxido de carbono e inquietudes.
     Procurei saber do motorista a que devíamos tanto acúmulo de meios de transporte, parados, na rua antes livre, onde o trânsito corria, solto?
     Num gesto um tanto brusco  de um homem cansado e entediado, diz-me:"Senhora, não vê? Fecharam o túnel  e todas  as ruas ao redor. Uma grande guerra acontece por aqui."
" Valei-me, Deus, o que fazer?", pensei de imediato.
     Indicado o caminho pelo rapaz, obedeço-lhe cegamente, Salto, meio trêmula e sigo rumo à Avenida Atlântica. Entro no primeiro táxi que avisto. Seguimos e , ao virar numa rua, o taxista pára, confuso. Tudo fechado pela força policial. A coisa era séria!
     Ainda no carro, olho  para o lado direito e reconheço a velha cafeteria  com ares europeus, agora envidraçada.
     Salto e, determinada, entro nela. Revejo um velho amigo, poeta dos bons, intelectual inveterado, conversador eloquente.   O que mais poderia desejar ante àquela situação tão diferente e assustadora? Tinha perdido momentaneamente o direito de voltar pra casa...Então, ali ficamos, a desfiar amenidades,  conversa regada pelo chazinho de erva-doce e acompanhada pela baguete fresquinha no capricho!
     É fazer do limão a limonada... Aproveitar as pequenas oportunidades que a vida nos dá. Palestramos mais de uma hora e, quando toda a situação estava sanada, retornei para casa. 
     Que dia! Quantas aflições! Que bom desfecho! 
      

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