quarta-feira, 17 de setembro de 2014

ENCONTRO COM CATARINA

     Estava decidido. Por que não passar naquela charmosa Cafeteria, antes do médico? ' Calma', dizia para mim mesma,  que dá tempo de sobra...
     Ainda tinha uns vinte minutos e as funcionárias são ligeiras no atendimento. Atravessei a rua no sinal e dirigi-me à galeria repleta de vitrinas atraentes. Mas me contive. Não, o que viera fazer ali era bebericar um saboroso cafezinho para despertar da sonolência típica do pós almoço.
     Ah, aqueles sapatos... a camiseta com a estampa de onça! Não, não. Decididamente, não! Concentrei-me. Entrei na fila.
     Nossa! Não imaginei que tantas pessoas quisessem sorver um cafezinho àquela hora do dia: às quatorze horas!
     Chamou-me a atenção uma senhorinha à minha frente. Baixa, menos que 1, 60m, que é a minha estatura; os sapatos marrons que calçava eram do tipo mocassim, mas  delicados, com salto  de uns dois a três centímetros; a pequena bolsa preta de couro pendurada com elegância no ombro esquerdo; usava calças pretas retas e uma blusa com mangas curtas, de malha fina num tom azul suave. Os alvos cabelos curtos e bem penteados, naturalmente seguros por algum laquê conferiam àquela pessoa um ar de leve seriedade. 
     Brincos pequeninos davam um toque de brilho  e, quando comentou algo com a moça à sua frente acompanhou com um gesto largo e fraterno. Ao virar-se para mim, seus olhos muito vivos e azuis chamaram-me mais ainda a atenção. Sem um pingo de maquiagem, seu rosto refulgia.
    Chamava-se Catarina e concluiu a nossa conversa dizendo que fiz muito bem em não batizar a minha primogênita com este nome, já que acarretava muito sofrimento...
     Sim, porque este meu jeito italiano de ser passei a assumir há algum tempo. E aquela senhora parecia-me tão bela! Puxei assunto.
     Cuidadosamente, toquei em seu ombro e falei da minha admiração pela sua maneira exímia de comportar-se,  mantendo elegância no seu porte impecável! Sem nenhuma extravagância, com naturalidade, arrebatou minha total atenção. Ela então sorriu-me, meio desconcertada. E iniciamos uma deliciosa conversa.
     Perguntou-me com um jeito travesso:
     "_ Diga-me , que idade você me dá?"
     Rapidamente, pensei que talvez tivesse uns oitenta, então dar-lhe-ia uns setenta para agradá-la. Dito e feito!
     Ficou contente com a minha suposição e , arregalando os olhinhos miúdos, vibrou:
     __" Tenho mais de oitenta! Oitenta e quatro anos!"
     Contou-me que suas roupas duram muito, a blusa tinha uns seis anos, a calça, uns oito... Mas não, não era esta a questão, disse-lhe. A questão era o seu porte ereto, mas não rígido; sua aparente severidade derrotada por um sorriso transbordante; seu olhar lúcido e tão amoroso. 'Quero ser como você quando crescer,' disse-lhe eu, meio em tom de brincadeira, meio de pura sinceridade.
     Os assuntos foram variados como dicas de remédios fitoterápicos, a recomendação do seu médico  para fazer pequenas caminhadas, duas vezes ao dia, como método para evitar o Mal de Alzeimer,  a minha vontade desencorajada pelo marido de dar o nome de Catarina à primeira  filha.
   Durante cerca de uns quinze minutos, que passaram breves demais, entre goles do café quentinho e  de deliciosos  biscoitinhos amanteigados,   nós duas rimos e também saboreamos a delícia de uma conversa entre pessoas identificadas. A linha de raciocínio pareceu-me semelhante e, quando nos despedimos, já nos sentíamos como amigas de uma vida inteira.
    

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