domingo, 6 de setembro de 2015

AMOR ÚNICO

 
 
 
 
 
 
     Voltei pensativa da habitual caminhada de domingo. Afinal, com toda esta friagem, nada melhor do que caminhar! Correr para esquentar! Sentir o fresquinho do inverno só mesmo do Rio de Janeiro, claro. Porque não gosto do inverno. Frio é para defuntos.  
     Nada como o sol beijando a pele, aquele calorzinho gostoso do outono e da primavera. As flores se abrindo, os galhos se virando à procura da  luz, ninhos sendo construídos.
     Tenho visto em minhas andanças muitos idosos passeando, indo às compras, sempre  acompanhados , seja do curador ou da curadora, seja da empregada. A maioria bastante limitados, como o senhorzinho que hoje passou por mim, amparado pelo enfermeiro. Vinha ele trêmulo, curvado ao peso dos anos, bem agasalhado, até um boné de feltro cor de vinho, muito estiloso, ele usava. Sua boca, semiaberta, causava estranheza. De pele muito clarinha, notavam-se escoriações em suas mãos.
    Os velhinhos apreciam ir ao mercado, ao hortifrúti como um passeio. Dá para entender. E vão muito bem arrumadinhos, um primor!
     Observo com respeito e uma certa dose de alegria, pois percebo neles algo assim como a demonstração de uma réstia de energia, uma resistência à perda paulatina da força da vida, uma negação à suposta inutilidade, uma reprimenda silenciosa às limitações que a idade avançada impõe.
     Estes senhores que desfilam pelos bairros da zona sul do Rio __especialmente em Copacabana, bairro que possui uma grande quantidade de pessoas com mais de setenta anos, mantém uma certa altivez de espírito. São corajosos e transmitem coragem.  E fico me perguntando se eles têm filhos.
     Porque nada mais impessoal do que um empregado assalariado para envolve-los em cuidados e atenções.
     Certamente, de seus lábios crispados aflorariam sorrisos amenizados pelo conforto da afeição natural e seus corações bateriam com mais ânimo! Suas vestes seriam menos pomposas, menos sérias e rígidas; certamente, esses idosos acompanhados pelos filhos amorosos ficassem antenados com o novo.
     Uma vez li um texto    onde era narrada uma conversa entre uma mãe e o seu filho, pedindo para que o filho fosse mais paciente com ela, que a desculpasse pelos esquecimentos de agora, da época da velhice, pelas mãos inábeis de agora, pois atingidas pela malvada artrose; pelos passos lentos, pela vista cansada.
     E neste texto muito comovente a mãe lembrava ao filho o tempo que tinha vivido  estas  dificuldades parecidas com ele, já que desde o nascimento a criança necessita  de total atenção e carinho, quase dos mesmos cuidados que seus pais na velhice.
     O choro perturbador que a mãe__ anjo de Deus procura entender, a febre repentina, as madrugadas insones, o desvelo constante ate a puberdade...E aí acontecem outras preocupações, noites insones novamente, atenção redobrada, preocupações, dedicação total para que estude e se torne uma pessoa digna e realizada.
    Mas  amor de mãe é único, incomparável.  Ao filho caberia  a companhia constante, cheia de desvelo, consequência de um amor agradecido.
     As nuvens que tolheram o sol durante todo o dia, desvaneceram-se e somente o frio renitente permanece. O que vejo neste início de noite é um céu límpido, com estrelas , promessa de um belo alvorecer.
 
"...
Impossível impedir
o branco dos cabelos,
assim como criar ouro:
como se livrar da idade
e de seus incômodos?
Melhor começar logo
o estudo do não ser."
 
(Wang Wei)


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