terça-feira, 10 de outubro de 2017

NO TÚNEL DO TEMPO

    
 
 
 
 
 
 
 
 

 
 Era uma boa distração para minha mãe. Para minha mãe. Para mim, um tormento . 
     Momentos que se tornavam longos, até a etapa final: a foto! Minha mãe elaborava, idealizava e não havia foto sem mim. Ela me arrumava, arquitetava as minúcias da veste, dos adornos, todo o cenário. Haja disposição e paciência! Para minha mãe, uma diversão, que ela fazia sorrindo o tempo todo com a sua inseparável Kodak. Eu, calada, obediente, cumpria todas as determinações dela:
     "Senta aqui, filha", dizia-me com ênfase, resolvida. Apruma-te, coloca a mãozinha sobre a outra, deixando aparecer o anel."
     " Agora, dá um sorriso, filhinha!" "Isso, muito bem." "Vira de costas, pra aparecer o decote."

     Costurava todos os meus vestidos e se orgulhava muito. Afinal, os copiava de uma loja famosa da Rua do Ouvidor. Desenhava, cortava o molde, comprava a fazenda igual e ficava uma perfeição! Que mulher habilidosa era a minha mãe!
     Desde cedo, bebê ainda, todas as fotos era mamãe quem as tirava. Cada sorrisinho... um flash!, como diria aquela personagem de uma novela da Globo.
     Sentada no troninho, dormindo, ao acordar, ao cair o primeiro dente, na cadeirinha de vime, no jardim, no batente da porta...
    As festas da Escola _chegada da Primavera, dia disso, dia daquilo, todas, D. Judith não perdia a oportunidade para vestir-me a caráter e ter o prazer de fotografar-me. Sem dúvida, tinha queda para tal Arte.
     Pequena, usava os cabelos soltos; logo depois, eram presos por grandes laçarotes que eu abominava. Mas criança não dava palpite, muito menos se estava gostando ou não. Tinha dores de cabeça terríveis, mas nunca dissera nada para não desconcertar minha mãe, sempre tão animada.
     Lembro-me que aos cinco anos fomos  a um renomado fotógrafo: Marcondes. Era um acontecimento!Ficaram lindas as fotos, apesar dos laçarotes continuarem a me martirizar.
     Mais tarde, aos quinze, retornamos ao mesmo artista, mas agora, já  adolescente, tive uma pequena crise de rebeldia! Não estava gostando nem do vestido, nem do sapato, de nada, nada! E fiquei séria durante toda a viagem, em pé, de condução comum, chamando a atenção de todos, pois trajava um belo vestido de festa, de cetim cor-de-rosa.
     Minha mãe afligira-se, não sabia o que fazer para contentar-me, porém, abdicar da foto, jamais! Fomos. E hoje, ao apreciá-las,com calma,  revivo ainda aqueles momentos, tão cheios de  ilusões.
     Nas redes sociais, as pessoas estão postando suas fotos da infância. É outubro. E, abrindo o álbum, para, quem sabe, escolher também alguma, mergulhei em muitas lembranças e fui tomada por uma enxurrada de emoções...
 
     "...
porque se pode ver entre o vidro e o retrato
uma folha outrora verde, uns cabelos que já foram vivos
e agora para sempre imóveis na moldura negra
e, na fotografia, alguém está sorrindo eternamente
quando um sorriso, para ser sorriso, devia ser efêmero...
..."
(RETRATO SOBRE A CÔMODA, Quintana) 
 
 

 
 

Um comentário:

  1. "Recordar da infancia,é a melhor maneira de ser sempre mais feliz"
    Linda menina.Parabens

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