O dia está ensolarado . Água açucarada espera pelos passarinhos na janela. Até acrescentei um petisco no suporte: a metade de um maxixe que comprei ontem no novo Horti Fruti aqui do bairro. O dia que surge parece tranquilo, conformado com o seu destino, a rotina da vida prossegue normalmente. E eu me lembro de papai , de manhãzinha, cuidando dos seus passarinhos engaiolados. Aquilo me incomodava.
Sempre assobiando, espírito leve, homem bondoso e calmo, papai tinha muita afeição aos pássaros. Mas os mantinha em cativeiro. E se deliciava ao vê-los cantarem, a quase explodirem seus delicados pulmões em árias sofisticadas.
Azulão, canário-da-terra, canário-belga, curió, coleiro e um pintassilgo que era a minha paixão. Bravo, se encostássemos a pontinha do dedo na grade da gaiola, ele fazia um barulhinho diferente e bicava sem parar. Eu cuidava dando-lhe banho, limpando a sua gaiolinha com o esmero de quem ama.
Um dia, aconteceu um imprevisto que fez papai ir às lágrimas: No silêncio da madrugada, foram roubados todos os pássaros. Morávavamos na última casa de uma vila comprida, bucólica, cheia de jardins e árvores frutíferas. Ficamos muito tristes. E meu pintassilgo?
Eles tinham sido vistos por muita gente. Papai levantava cedinho nos finais de semana e lá ia ele com algumas gaiolas nas mãos exibir o canto que nunca desafinava. Deu nisso. Papai entristeceu-se de tal maneira que não quis mais cercar-se deles.
E eu fiquei pasma tentando entender como alguém tivera a triste coragem de roubar pássaros causando tanto infortúnio?
Acho que por isso amo tanto os pássaros, mas quero vê-los livres, afinal para que as asas se não podem voar? Privá-los da liberdade para ouvi-los cantar parece método de tortura.
Existem agora nas esquinas pássaros de plástico que possuem um mecanismo no qual quando batemos palmas eles cantam. É cada uma!... Tudo para preencher a tal da solidão...já ouviram falar dela?
(lavadeira-mascarada, no alto da Pedra do Arpoador)
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